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OBRIGADA, MAS DISPENSO SEU SOBRENOME, MARIDO
Eu não entendo nada desses cerimoniais, então nem posso dizer com certeza que fui madrinha de casamento (no civil é madrinha?) de um casal amigo, uns sete anos atrás.
Eu e o maridão chegamos lá, no cartório marcado em Joinville, e, depois de enfrentar uma fila, fomos testemunhas que Rodrigo e Clarice queriam mesmo ficar juntos por toda a eternidade, ou algo assim. O que me chamou a atenção é que, na hora de assinar toda a papelada, vi que Rodrigo é que iria adotar o sobrenome de Clarice, e não o oposto, como geralmente acontece. Não foi nada combinado com a feministona aqui -- só descobri na hora.
Claro que fiquei muito feliz que, no único casamento em que fui madrinha, houve uma inversão desses estereótipos de gênero! Porque gente, vamos admitir: pegar sobrenome do marido é uma tradição patriarcal, que sinaliza propriedade. Existe algo mais cafona que ser apresentados como Sr. e Sra. (Nome completo do marido)? É algo tão coluna social... Uma invisibilidade total da mulher.
Não é a única tradição patriarcal do casamento, decerto. Isso do noivo pedir a mão da noiva pro pai, do pai levar a filha pro altar e entregá-la ao noivo -- suponho que todos esses cerimoniais façam parte da mesma cartilha: a de que uma mulher deve ficar sob a tutela do pai, e depois do marido. Nos EUA, as mulheres precisavam adotar o sobrenome do marido se quisessem ter alguns direitos básicos, como os de serem donas de propriedade, dirigir e votar.
Ah, mas já ouvi alguns caras americanos dizendo, essa não é uma tradição machista, já que a mulher sempre fica com o sobrenome do pai mesmo, e não da mãe. Sim, mas há um abismo de diferença entre ficar com o sobrenome do pai e com o do marido. O pai ajudou a te fazer. E também, aqui no Brasil, a pessoa fica com os dois sobrenomes, não?
Nunca passou pela minha cabeça pegar qualquer um dos dois sobrenomes do Silvinho (Cunha Pereira), que são meio comuns demais, com todo o respeito. Já ele adoraria ficar com meu sobrenome por parte de pai, Aronovich. Porque é um nome russo (ucraniano, pra ser mais exata) e os enxadristas russos são os melhores do mundo. Lembro de uma vez em que Silvio e eu fomos jogar um torneio em Buenos Aires e, só por causa do meu lindo Aronovich, me colocaram com um rating altíssimo. Nem preciso dizer que a ilusão de que eu seria uma campeã russa não durou muito...
Só sei que o maridão adoraria se chamar Silvio Aronovich! Mas é besteira, é vaidade, dá um trabalhão trocar de sobrenome em todos os documentos. E, além disso, aqui no Brasil não se pode substituir sobrenome, apenas incluir. Logo, ele viraria Silvio Cunha Pereira Aronovich. Ok, dependendo do estado, pode-se suprimir um dos sobrenomes originais. Com sorte, o maridão viraria Silvio Cunha Aronovich.
Tá, mas você acha que, se ele incluísse meu Aronovich, isso seria indicativo de algum poder que eu tenho sobre ele? Claro que não. Seria só por causa do xadrez mesmo. E não vamos cair em falsas simetrias -– mulher ficar com o sobrenome do marido é o padrão, é o esperado, é o peso da tradição patriarcal. Homem ficar com o sobrenome da mulher é escolha.
Com a mudança dos tempos, essa escolha vem se tornando cada vez mais comum. Hoje 25% dos homens brasileiros já adotam o sobrenome da mulher ao casar. Nada mau, hein? Um em cada quatro carinhas está dizendo, em alto e bom tom, f*ck tradition. Ou, pelo menos, “o sobrenome dela é mais bonito que o meu”.
Se bem que o que acontece na maior parte dos casos é que o marido inclui o sobrenome da esposa, e a esposa inclui o sobrenome do marido. Ainda assim, é uma enorme mudança cultural. Até 2002, um marido pegar o sobrenome da esposa não era uma opção (era preciso uma autorização judicial). Foi nesse ano em que o Código Civil mudou e se tornou mais igualitário.
Mas olha só a rapidez com que alguns costumes mudam: em 2002, só 9% dos maridos incluíam o sobrenome da esposa. Dez anos depois, esse índice já subiu pra 25%. Em cartórios de algumas cidades, como os de Marília, SP, o aumento do número de homens que adotam o sobrenome da esposa cresceu 302% em uma década.
Óbvio que o machismo ainda é gigantesco, e os homens que fogem da tradição enfrentam piadinhas e cobranças. Nesta boa reportagem do G1, um dos entrevistados brincou que não poderia usar “o nome de outro homem” (referindo-se ao sobrenome paterno da esposa). Um aposentado resumiu bem como se sente perdido no meio de papéis menos fixos de gênero: “Está errado. A mulher tem que adotar o sobrenome do homem. Mas está tudo tão mudado hoje em dia que a gente nem sabe mais o que fazer”.
Pra ver como isso é patriarcal, é só ver que, na Argentina, ainda se usa o “de”. O nome da minha mãe, por exemplo, é Nelida Maria Aguero de Aronovich (nome do meu pai). A mulher é do marido! (por incrível que pareça, na maioria dos países islâmicos a mulher mantém seu sobrenome ao casar, sem adotar o do marido). No Japão, as mulheres são obrigadas a pegar o sobrenome do marido para fazerem parte da mesma casa.
Nos países em que o casamento entre pessoas do mesmo sexo é permitido, varia bastante, mas em geral cada um pode escolher individualmente se adota ou não o sobrenome do parceirx, e tem os mesmos direitos das pessoas em casamentos héteros (como deveria ser).
Os Estados Unidos, país conservador que é, não aceitam insubordinações. Um exemplo é o de Hillary Clinton. Ela manteve seu sobrenome, Rodham, até quando seu marido Bill era governador de Arkansas. Mas foi muito criticada por isso -- os eleitores acharam que ela não mudar seu nome pra Clinton era sinal de que ela não estava comprometida com o marido. Em parte, Bill perdeu a reeleição para governador porque seu adversário atacou a independência de Hillary. O adversário se referia a sua esposa como "Sra. Frank White", e reforçava o "Hillary Rodham". Calcula-se que isso custou a Bill 6% dos votos. E hoje mais americanos acreditam que “mulheres que mantém o sobrenome de solteira são menos comprometidas” (10% acham isso!) do que na década de 80.
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Casamento de Hillary e Bill, em 1975 |
Desde a campanha de 2008, em que Hillary disputava a candidatura democrata com Obama, ela simplesmente passou a se identificar como Hillary Clinton. Bem diferente de quando ela se casou e continuou se chamando Hillary Rodham: "esse nome mostrava que eu ainda era eu", contou ela numa biografia.
Hillary não está sozinha: até 2007, quando ela era senadora, cinco das sete senadoras americanas assinavam apenas o sobrenome do marido. Só Hillary e uma outra mantinham o sobrenome original junto ao do marido.
Mais de 70% das mulheres americanas responderam numa pesquisa de 2009 que elas concordam que uma mulher deve mudar seu nome ao casar. Metade dos entrevistados acha que deveria haver uma lei forçando as esposas a adotar o sobrenome do marido. Mas nem precisa de lei: 95% das americanas pega o nome do marido (inclusive a forte e independente Michelle Obama).
Nos EUA 1% das mulheres juntam com um hífen o sobrenome original com o do marido. Tipo: durante os vinte anos em que a atriz Robin Wright foi casada com Sean Penn, ela assinou Robin Wright-Penn. Sinceramente, acho isso ridículo, principalmente entre mulheres famosas. Porque, quando o casamento acaba (e ele acaba em 50% dos casos), a pessoa terá que mudar de nome de novo.
Mas já vi até feminista americana juntar seu nome com hífen ao do marido ao casar. Não quero ditar regras, mas parece uma desrespeito com o combate de feministas históricas como a sufragista Lucy Stone, que no século 19 teve que lutar na justiça pelo direito de manter seu sobrenome.
Logicamente, hoje a maior parte das mulheres ocidentais que adotam o sobrenome do marido não pensa que são sua propriedade. Pensa que é um gesto simbólico de se tornar um só, ou parte de um time. Sei. Se não houvesse machismo nessa tradição, os homens também ficariam com o sobrenome da esposa. E não sofreriam piadinhas e pressão das famílias.
Sei que muita mulher faz isso pra ceder aos pais, principalmente aos pais do marido. Um casal de amigos meus não fazia questão que ela adotasse o sobrenome dele. Era indiferente. Mas as famílias pressionaram, e ela pegou o sobrenome do marido. Arrependeu-se amargamente ao lidar com a burocracia toda: teve que fazer novo RG, CPF, passaporte, carteira de motorista, título de eleitora, cadastros bancários...
Conheço também mulheres que adotaram o sobrenome do marido antes de se tornarem feministas. Hoje elas não fariam. E já ouvi de uma feminista que respeito que ela pegou o sobrenome do marido porque achava o dela muito comum e feio. Também acho super estranho manter o nome do marido após um divórcio. Mas enfim. Cada uma faz o que quer, e não é meu papel criticar escolhas individuais. Nem a pau que vou chegar pruma feminista e gritar: “Traidora da causa! Você pegou o sobrenome do marido! Cadê sua carteirinha feminista pra eu cassá-la?!” Mas não adianta negar: é uma tradição patriarcal. Então, como feminista que sou, gostaria que essa tradição ultrapassada deixasse de existir.
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