Uma organização pró-direitos humanos divulgou um telefonema gravado que McCain anda mandando a seu eleitorado mais retrógrado, tentando convencê-lo que ele é, também, um troglodita de direita. A ligação diz: “Nós precisamos de alguém que não vai vacilar na Casa Branca: que vai acabar com o aborto, parar com o lixo na mídia e com as tentativas de banir Deus de todas as esferas da sociedade” (minha tradução). E, obviamente, McCain condena direitos iguais pros gays, porque pra direita cristã homossexualismo é um pecado capital, embora não afete em nada a vida dos heteros. Como disse meu orientador aqui nos EUA, se a direita cristã detestasse ervilhas, os republicanos iriam condenar esse legume em tudo quanto é debate.
O partido republicano sempre foi de direita. Pra gente, que é de fora, ele pode parecer bastante parecido com o partido democrata, mas não é. Os discursos são diferentes. O que os republicanos pregam é o governo mínimo, o que se chama de “starve the beast” (matar a besta de fome). A besta, no caso, é o governo, e pra matá-la de fome é fácil: é só acabar com todos os impostos e, assim, com todas as funções sociais do governo. Reagan, um ídolo pra eles, liquidou inúmeros programas sociais criados nos anos 30 pelo Roosevelt pra salvar as pessoas da Grande Depressão. O discurso é o mesmo dos nossos partidos mais à direita no Brasil, como o PSDB e o DEM (ex-PFL, ex-Arena): isso tudo que o Getúlio fez de salário mínimo, décimo-terceiro, previdência social etc foi bonito na época, mas num mundo globalizado como o de hoje já não faz o menor sentido. Os empresários gastam demais contratando um funcionário, coitados! Sistema universal de saúde pra quê, meu Deus? Nossas empresas de seguro-saúde são tão caridosas e eficientes! Quem quiser tratamento médico que o compre, ora. Sai bem mais em conta!
Voltando ao partido republicano americano, a plataforma varia de estado pra estado, mas as diretrizes são idênticas. Por exemplo, aqui em Michigan os republicanos querem impedir que contribuições sindicais possam ser descontadas da folha de pagamento. Na prática, isso equivale ao fim dos sindicatos, e a aniquilação de sindicatos equivale a dar poder total às grandes corporações, sem fiscalização. Quanto ao aborto, a posição é clara: “O Partido Republicano de Michigan acredita que a vida começa na concepção e que o Estado deve sempre defender a vida humana inocente, da concepção a sua morte natural”. Traduzindo, eles são radicalmente contra o aborto e a eutanásia. A “vida inocente” que eles defendem obviamente não é a da mãe. Não, porque mulher é traiçoeira, é só a gente se distrair um instantinho que lá estão elas, matando seus fetos – opa, “seus” não! Nossos! Isso da gente gostar de governo mínimo não quer dizer abrir mão de impor valores básicos. Afinal, a gente não quer que o governo interfira na economia, mas precisa proteger os pobres fetos indefesos das garras das mães. Se depender da gente, mulher não aborta nunca – nem em caso de estupro, nem em caso de risco de vida pra ela. A vida inocente em primeiro lugar! E mulher, como a gente sabe, não tem nada de inocente. Só sobe um pouquinho de status ao ser mãe (de preferência, de varões).
Comparados aos republicanos, os democratas são quase comunistas.