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PAIS DIVORCIADOS COBRANDO APOIO INCONDICIONAL DA FILHA
A M. me enviou este email:"Leio seu blog e nem preciso dizer que adoro. Tenho 16 anos e há um tempo me tornei (ou me descobri) feminista. Leio vários blogs e acompanho páginas sobre o tema e tal, sou hiper feminista, meus amigos ficam se policiando para não soltarem nada machista/homofóbico/sexista/classista/racista perto de mim pois sabem que vou ficar meia hora falando. Mas separada da minha convicção de ser feminista e do quão libertário esse movimento é pra mim (e pra todos, claro) se esconde um problema. Meus pais são separados há uns quatro anos. Foi um divórcio difícil e pesado, cheio de brigas, traições, idas e vindas e muita mágoa. Até hoje, quando tudo está quieto, vem uma discussão, uma lavada de roupa suja, uma passada na cara de uma favor feito há anos etc. É realmente infernal. Acontece que, numa dessas, mas pro início do divórcio na verdade, meus pais tiveram uma briga muito séria. Eu não sei com detalhes o que aconteceu (apesar de já terem me explicado, cada um com sua versão, várias vezes), mas em resumo, minha mãe fez algo que meu pai detestou e tinha algo a ver com o carro, que estava no nome dele e ela ficou devendo ou algo assim. Não foi só isso também, acho que ela mudou minha irmã de escola sem avisá-lo ou algo do tipo, daí ele mandou um email pra ela falando um monte de coisas que ela fez que eram erradas (concordo que eram erradas e que minha mãe não tomou certos cuidados que acabaram prejudicando meu pai, mas também não acho que ela fez por mal) e a chamando de nomes horríveis como p*ta, vagabunda etc (parece que são os únicos xingamentos direcionados as mulheres).Lembro de uma frase do email que me marcou que era mais ou menos assim: "A vontade que me dá é de ir aí e te encher de porrada", apesar de que ele mesmo sabe que nunca faria isso. Minha mãe então foi numa delegacia e entregou o email com as ofensas e a ameaça, fazendo com que meu pai ganhasse uma ordem judicial que o proibia de chegar perto da minha mãe. Depois de um tempo, meu pai veio expressar a tristeza que ele sentiu quando descobriu que eu não tinha feito nada. Que eu não o defendi, não disse 'mãe, não faça isso', porque ele podia ser preso e citou um milhão de atrocidades que os presidiários sofrem(obviamente ele não seria preso).A maioria das brigas dos meus pais é por algo relacionado a dinheiro. Isso é lamentável, até porque nenhum dos dois precisa realmente disso. Meu pai tem mais luxo que minha mãe, mas ela também não depende de pensão pra viver, sabe? A questão é: eu não consigo enfiar meu feminismo nessa história porque são meus pais. São duas pessoas que eu amo muito e que se odeiam. Eu não consigo saber se minha mãe se precipitou levando uma briga(que ela poderia ter revidado por email mesmo) pra uma delegacia, fazendo com que meu pai recebesse intimação no trabalho como um bandido, se eu errei em não ter defendido meu pai e impedido que ela fizesse isso, ou se meu pai é quem estava errado, e minha mãe teve razão em ir na delegacia recorrer à Lei Maria da Penha. Por isso Lola, eu queria sua opinião. Sei que é difícil falar quando não se conhece bem a situação e até posso estar sendo tendenciosa, mas ainda assim eu queria sua opinião. Como mulher e como feminista, você tomaria a decisão que minha mãe tomou? Só uma última coisa: depois de um tempo, quando comentei com minha mãe, ela disse que fez aquilo porque não queria que ele pensasse que pode falar assim com uma mulher e que queria dar o exemplo pras filhas ou algo assim. Minha mãe também havia xingado meu pai na mesma troca de emails (provavelmente não com palavras desse tipo). Então na realidade, acho que ela não se sentiu realmente ameaçada ou intimidada, foi uma oportunidade pra ela se vingar da traição. Mas isso é só uma opinião e eu posso estar sendo muito machista e cruel."Minha resposta: Imagino que você saiba, M. querida, que isso que seus pais fizeram e continuam fazendo com você não é só comum, como também um dos maiores erros de pais que se separam. O divórcio deles não teve nada a ver com você. Quase nunca é consequência de alguma coisa que os filhos fizeram ou deixaram de fazer. Mas muitos pais e mães fazem questão de tentar jogar o filho ou filha contra uma das partes. Acho isso uma sacanagem incrível. Ainda mais com uma garota de doze anos, que é a idade que você tinha quando seus pais te envolveram nesse drama todo.Não consigo entender a raiva mortal que tantos ex-casais sentem. Pô, em algum momento da vida conjugal eles se amaram, ou pelo menos se gostaram. Ainda que haja traições, mágoas e brigas, não dá pra simplesmente terminar o relacionamento? É tão impossível assim continuar sendo amigos, nem que seja pelo bem dos filhos? Você não tem que tomar lado. Você ama sua mãe e seu pai, e deve continuar amando. Os problemas que eles ainda têm devem ser resolvidos entre eles, sem intervenção dos filhos. Sua mãe errou em tomar uma decisão importante (sobre o carro ou sobre a escola da sua irmã) sem consultar seu pai. Seu pai errou em enviar pra sua mãe um email cheio de ofensas e ameaças. Desculpe, mas no momento em que alguém com quem tenho contato frequente me escreve que tem vontade de me encher de porrada, eu bem provavelmente tentaria me precaver e procurar meus direitos. Dentro do contexto geral da violência doméstica, de que dez mulheres são mortas no Brasil todos os dias por parceiros ou ex-parceiros, acho que sua mãe fez bem em pedir a ordem judicial impedindo que seu pai se aproximasse dela.Mas, pelo que você conta, você teve que ouvir as versões de cada um várias vezes. Sua mãe talvez tenha te mostrado o email violento do seu pai. Seu pai ficou fazendo chantagem emocional de "por que você não interviu?" E você tinha doze anos quando isso tudo aconteceu! Você, já sofrendo com a separação de seus pais, foi forçada a tomar partido. Uma coisa é você querer tomar partido, outra é ser obrigada a isso. Algo que eu considero uma crueldade irônica, digamos, é como os pais, quando casados, fazem de tudo para manter os filhos longe de qualquer tomada de decisão. É tabu pros filhos saberem quanto os pais ganham ou gastam. Mas, na hora do divórcio, muda tudo. Aí os filhos, que até então não tinham voz nas decisões da família, passam a ser envolvidos em todas as questões, sempre. Dessa forma, um divórcio ganha potencial pra virar um evento traumático na vida da criança (ou adolescente).É possível ver como tudo isso te atormenta ainda hoje, quatro anos depois do divórcio. Minha opinião é que os dois erraram, e que você não precisa concordar 100% com cada um. Claro que a mera ideia de que seu pai seja preso já dá medo -- assim como a mera ideia de que alguém, qualquer um, espanque sua mãe. Mas espero que esses medos tenham ficado no passado.Outra coisa, querida M. Entendo que você esteja super feminista, ainda mais se descobriu seu feminismo há pouco tempo. Mas não tente "enfiar seu feminismo" em tudo. Seu pai pode ter agido como um machista opressor quando xingou e ameaçou sua mãe. Sua mãe pode ter denunciado seu pai pra dar um exemplo (feminista) pras filhas de que nenhuma mulher deve ser ameaçada dessa forma. Mas no geral são apenas dois adultos imaturos agindo muito mal na frente da filha adolescente.
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