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Pedaladas e avanços institucionais - MAÍLSON DA NÓBREGA
FOLHA DE SP - 06/11
É pouco provável que tenha havido pedaladas fiscais em 2015. Afigura-se procedente, pois, a negação feita pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. A nova gestão do Tesouro Nacional dificilmente terá recorrido às tristes manobras contábeis de anos anteriores, condenadas por especialistas e depois pelo TCU (Tribunal de Contas da União).
Pedaladas são artimanhas contábeis utilizadas pelos governos do PT para esconder a grave situação das contas públicas. O objetivo foi falsear as estatísticas para dar a impressão de que as metas fiscais eram cumpridas. Houve dois tipos de pedaladas. Uma violava a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF); a outra era mero atraso no pagamento de obrigações do Tesouro, sem infringir a lei.
Um exemplo de manobra ilegal foi a orientação à Caixa Econômica para pagar benefícios do Bolsa Família, sem que previamente lhe tenham sido transferidos os correspondentes recursos.
Neste caso, há um relacionamento formal entre o Tesouro e o beneficiário. A Caixa atua como agente responsável pelo pagamento. Se ela pagou o benefício de seus próprios cofres, realizou um empréstimo ao Tesouro, o que é proibido pela LRF.
No caso do BNDES e de outros bancos oficiais, o governo celebra um contrato pelo qual a instituição se compromete a conceder empréstimos mediante taxa de juros subsidiada, isto é, inferior à taxa de captação dos correspondentes recursos.
O relacionamento formal do Tesouro é com o banco e não com o beneficiário. Cabe-lhe fazer a "equalização" das taxas, isto é, pagar a diferença entre o custo incorrido pela instituição para obter os recursos e o que ela recebe do cliente. Se a obrigação não é cumprida no prazo previsto, caracteriza-se atraso no pagamento. O banco não terá efetuado um empréstimo ao Tesouro.
A LRF não veda atrasos de pagamentos. A inadimplência, comum em momentos de crise, acontece também em obras de infraestrutura e no fornecimento de bens e serviços ao governo. Se os atrasos não forem regularizados até o término do exercício, virarão "restos a pagar", ou seja, obrigações de orçamentos anteriores que podem ser liquidados no exercício corrente.
O fornecedor do bem ou serviço deixa de receber seus direitos tempestivamente, mas não efetua um empréstimo ao Tesouro.
Do ponto de vista financeiro, os dois tipos de pedaladas produzem o mesmo efeito, adiar o desembolso de caixa. Sob o aspecto formal, representam operações com características distintas. A primeira afronta a lei. A segunda, quando utilizada de forma sistemática, diz mal da gestão do Tesouro.
Uma pode redundar em parecer pela rejeição das contas do governo pelo TCU; a outra não tem serventia para qualquer fim, menos ainda para justificar um pedido de abertura de processo de impeachment.
A exemplo do que ocorreu em outras oportunidades, distorções funcionais como as das pedaladas criam oportunidade para promover avanços institucionais, em benefício da melhoria de gestão e para evitar a repetição de erros lamentáveis.
Esse é, pois, momento para aperfeiçoar a legislação com dois novos dispositivos. Primeiro, proibir bancos oficiais de efetuar pagamentos por conta do Tesouro sem o prévio recebimento dos correspondentes recursos. O segundo dispositivo estabeleceria que atrasos superiores a, digamos, 30 dias seriam automaticamente contabilizados como despesa ou dívida pública.
Como se sabe, as pedaladas não aconteceram por escassez de caixa. O Tesouro tem perto de R$ 1 trilhão depositados no Banco Central. O objetivo era simplesmente manipular as estatísticas das contas públicas.
Com essas duas medidas, não haveria incentivo para manobras contábeis, pois não seria mais possível mascarar maus resultados das contas públicas. A transparência e a precisão das estatísticas aumentariam.
Mudanças adicionais poderiam ser adotadas para desestimular outras manipulações empregadas pela gestão anterior da Fazenda e do Tesouro, mas essas duas tenderiam a ser as mais relevantes.
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