Aqui não tem camelô vendendo DVD pirata do filme que está em cartaz nos cinemas porque não há camelô vendendo qualquer coisa. Não vou dizer que não existe, mas eu pelo menos nunca vi, nem em Detroit, nem em Chicago, nem em Washington, nem em NY (mendigos, ao contrário, têm de monte). Não é comum o comércio informal nas ruas, em parte porque o desemprego aqui é muito menor que nos países pobres (apenas uns 6%, mas subindo). E ter um emprego formal aqui quase sempre vai pagar mais que um informal, o que certamente não ocorre no Brasil. Mas voltando aos DVDs piratas, há tanta diferença assim entre comprar um de um camelô e download o arrasa-quarteirão da vez no nosso computador? Bom, deve haver, porque eu pessoalmente nunca comprei um DVD pirata, mas já downloaded vários. E claro que no caso do DVD pirata há toda uma rede pra fabricar o troço, que inclusive usa trabalho escravo. E alguém tem lucro com isso (o pobre camelô deve ter o menor lucro). Mas ambos os casos são ilegais. Só que ilegais até que ponto? Pra quem? O movimento do “copyleft” (que usa o cezinho do Copyright invertido, e as palavras “All wrongs reserved”, ao contrário do “Todos os direitos reservados”) defende que direitos de copyright são uma instituição que só visa o lucro. O Copyleft quer que filmes, livros, músicas e obras de arte estejam acessíveis pra todo mundo. Como, sei lá, os blogs, o YouTube, alguns acervos (ainda pouquíssimos) de biblioteca...
Os grandes estúdios vêm fazendo uma campanha apelando pro nosso senso moral. Você já viu, né? Tá em quase todos os DVDs agora. A peça veiculada pergunta se a gente roubaria uma bolsa, se pegaria dinheiro de alguém, e compara tais crimes com download de filmes. Mas isso aconteceu com os CDs de música e vai acontecer com os filmes. Francamente, quando foi a última vez que você comprou um CD? Pro maridão e eu, que somos velhinhos, demorou um tempão até a gente gravar um CD com as primeiras músicas. Mas pense no pessoal nascido em 1990, 95. Essa nova geração provavelmente nunca comprou um CD. Cresceu assim. Não tem o menor pudor em download um filme. No entanto, no caso do cinema, ainda restam outros atrativos. Assim como download um CD não faz ninguém deixar de ir a um concerto de rock, ver no monitor de 14 polegadas um filme gravado com câmera digital tremida, com espectadores passando na frente, não deveria substituir a experiência de ir ao cinema. Ir ao cinema continua sendo uma espécie de ritual. Pra mim e pro maridão é uma das raras ocasiões da semana em que nos animamos a sair de casa pra fazer alguma coisa juntos. E mesmo assim, cada vez mais eu passo a encarar alguns filmes como não merecedores de serem vistos no cinema. Atire a primeira pedra quem não pensou “Ah, esse filmeco vou esperar pra ver quando sair em DVD”. Agora não precisa nem esperar. No meu caso em particular tem menos a ver com os efeitos especiais ou a “grandiosidade” do espetáculo que com fatores de interesse mesmo (quem tá no filme? Quem é o diretor? Qual o tema?). Agora, se os espectadores continuarem a se comportar mal, tagarelando durante o filme, aí é que eu vou perder toda a vontade de ir ao cinema mesmo. É uma questão dos cinemas fazerem campanha. Tem um cinema aqui perto, no centro de Detroit, onde tá impossível ver filme. O público não fica quieto. Passei a sessão toda de O Gângster fazendo Shhhh, e nada. Havia no mínimo três casais, em locais diferentes do cinema, que não se calaram o filme inteiro. E não era com voz abafadinha não. Era uma conversa em tom alto. Eles gritavam pra encobrir o barulho do filme, que tava atrapalhando o papo, sabe? Parei de ir a esse cinema. Mas não é que as pessoas de Detroit são malcriadas e estúpidas, e as pessoas dos subúrbios são refinadas. É que nos cinemas do subúrbio, antes do início do filme, um comercial pede pra que o espectador desligue o celular e não fale com o vizinho, pra não atrapalhar. Claro que já tivemos experiências desagradáveis e precisamos trocar de lugar. Mas uma campanha dessas, veiculada antes de cada sessão, conscientiza o público. Compare com o que tá escrito em letras minúsculas no copo vendido por uma das redes brasileiras: “Fale baixo durante a sessão”. Uh? Fale baixo?! Faça o favor de fechar a matraca, pô!