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Primavera Árabe: A ilusão democrática
Rodrigo Constantino
A “Primavera Árabe” encantou muita gente no Ocidente. Vários celebraram o “despertar” do povo para a democracia, lutando contra regimes opressores no poder há décadas. Mas a comemoração foi precipitada demais. Os pilares culturais e institucionais que permitem o funcionamento adequado do regime democrático simplesmente não estão lá.
A “democracia”, nesse caso, pode ser apenas uma forma de teocracia disfarçada, com os fanáticos muçulmanos tomando o poder e impondo a sharia – a lei islâmica. É o que defende Andrew McCarthy em seu excelente livro novo Spring Fever: The Illusion of Islamic Democracy. McCarthy é autor também de The Grand Jihad, onde já havia exposto como os fanáticos do Islã estão sabotando os pilares da civilização ocidental de dentro do sistema.
São leituras obrigatórias para quem quer entender melhor como o radicalismo islâmico opera nos Estados Unidos, e porque a democracia no Oriente Médio ainda não passa de uma doce ilusão. Gostamos de crer que o povo islâmico da região despertou, mas isso pode ser somente uma vontade nossa de acreditar nisso.
Para o autor, muitos no Ocidente desejam crer que os povos árabes compartilham dos mesmos ideais de liberdade que nós, e acabam ignorando que a “Primavera Árabe” pode ser, na verdade, a ascendência da supremacia islâmica. O governo de Mursi no Egito deixou claro esse risco: várias medidas do governante eleito foram na direção da sharia, e o alinhamento inclusive com grupos terroristas ficou evidente.
McCarthy disseca o caso da Turquia, pois se trata do país mais ocidentalizado da região, graças ao legado de Ataturk. Erdogan, entretanto, deu demonstração de sobra de que não quer saber disso, preferindo atender aos anseios dos defensores da sharia. Nem há surpresa aqui: tais são os objetivos declarados desses governantes! Eles alegam abertamente que o estado deve ser guiado pelo Islã, e essa é a visão que eles têm de liberdade: “perfeita submissão”.
No Ocidente, especialmente na esquerda progressista, a visão muliculturalista impede a constatação desse fato. Simplesmente reproduzir o que as próprias lideranças islâmicas afirmam é suficiente para ser chamado de “islamofóbico”. Sem querer julgar qualquer coisa (à exceção de seus oponentes conservadores e os “fanáticos” do Tea Party), esses progressistas tentam remodelar o Islã à sua própria imagem: uma nobre e tolerante religião.
Para o autor, essa é a principal lição da “Primavera Árabe”: a miragem do Islã como uma força moderada e amigável à transformação democrática existe somente em nossas mentes, para nosso consumo próprio. Lá, no Oriente Médio, a mentalidade predominante não tem nada a ver com isso, como atos e pesquisas apontam. Os governantes mesmos se sentem ofendidos com o uso do termo “moderado”, pois para eles, o Islã é o Islã, e ponto. Seguir sua lei é absolutamente imprescindível. Estado laico? Nem pensar!
Por acaso o Irã tem se tornado mais moderado nos últimos anos? Por acaso o Hamas é moderado em Gaza, ou ocorreu nova eleição desde que o grupo foi escolhido? Por acaso a constituição iraquiana, aprovada sob a supervisão americana, deixa de colocar o Islã como a religião oficial que deve pautar as leis? O sucesso eleitoral do Hezbollah no Líbano mudou o país, ou serviu para que o Irã pudesse contar com um braço terrorista com o manto de “democracia” em suas provocações jihadistas?
Aplicar a nossa idéia de liberdade individual ao contexto do Oriente Médio é a grande ingenuidade que cometemos, segundo o autor. Essa cultura de povo soberano não está presente nesses países. Para eles, seguir a religião por meio do estado, sob o comando de um representante forte que irá garantir tal submissão, isso é “liberdade”. Parlamento com poderes legislativos, pesos e contrapesos, descentralização de poder, tolerância às minorias, tais são valores enraizados no Ocidente, mas não nos países islâmicos.
Outro ponto importante abordado pelo autor é que os fanáticos muçulmanos compreendem que a disputa é cultural acima de tudo. O dawa é o proselitismo da sharia, sem o uso de violência. Intimidar críticos, cultivar simpatizantes na imprensa e nas universidades, explorar a tolerância e a liberdade religiosa ocidental, infiltrar-se em nosso sistema político, retratar qualquer crítica como “islamofobia”, eis a guerra que eles estão travando e vencendo até aqui. Esses foram os ensinamentos de Hassan al-Banna, um dos fundadores da Irmandade Muçulmana, que pretende dominar todo o planeta com sua religião.
O que McCarthy mostra no livro é como vários institutos islâmicos nos Estados Unidos servem apenas como fachada para disseminar os valores radicais de sua fé, ou então fazer um elo com grupos terroristas. Não é que eles não compreendam a democracia ocidental, ou não sejam sofisticados para isso; é que eles não desejam tal modelo para eles! Eles olham com profundo desdém para o resultado do que essa democracia e essa liberdade conquistaram no Ocidente. E eles querem mudar isso.
McCarthy não tem medo de concluir que, nos termos de Samuel Hutington, trata-se de um “confronto de civilizações”. Não reconhecer isso é um perigo, pois o outro lado avança de forma agressiva. A meta das lideranças islâmicas, com o apoio da maioria do povo, é o “renascimento islâmico”, o resgate de uma época de predominância do Islã.
Os que são considerados “moderados” pela esquerda ocidental não escondem o mesmo sonho, e simpatizam com os terroristas, retratados por eles como “resistentes”. O ódio a Israel e aos Estados Unidos está presente também, mas muitos fingem não ver. McCarthy resume sem rodeios: “Nesta região antidemocrática, a democracia real não tem a menor chance contra a supremacia islâmica”.
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