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TPP coloca Brasil em xeque - MAURO LAVIOLA
VALOR ECONÔMICO - 30/10
Após mais de cinco anos de intensas negociações, os 12 países membros da Parceria Transpacífico ("Trans-Pacific Partnership") finalmente assinaram o maior dos chamados mega-acordos em negociação. Liderados pelos EUA, o maior interessado no êxito dos entendimentos, os integrantes somam cerca de 40% do PIB global e 33% do comércio mundial. Juntos compõem um quadro econômico-geográfico heterogêneo, reunindo países ultradesenvolvidos, emergentes importantes e nações de menor desenvolvimento relativo, situados nas Américas, no Leste Asiático e Oceania: EUA, Canadá, México, Peru, Chile, Japão, Brunei, Malásia, Vietnã, Cingapura, Austrália e Nova Zelândia. É interessante notar que a TPP engloba dois subgrupos americanos, o Nafta e a Aliança do Pacífico, com a curiosa ausência da Colômbia, sendo o México integrante de ambos os blocos.
O escopo geral desse mega-acordo ultrapassa as regras básicas delineadas no âmbito multilateral da OMC e incorpora um teor de disciplinas denominadas OMC Plus. É importante registrar que foi adotado um memorando aditivo ao texto formal proibindo ocorrer manipulações cambiais por qualquer dos Estados Partes.
A TPP basicamente é um acordo de comércio e investimentos, e seus principais fundamentos são: eliminação gradual de tarifas aduaneiras, com cronogramas especiais entre os EUA e o Japão com relação a caminhões, automóveis e autopeças, que podem se alongar até 35 e 25 anos no caso dos veículos montados; é curioso observar que nas negociações EUA-Coreia do Sul, a eliminação de tarifas para automóveis está prevista para 5 anos e caminhões para 10 anos, ou seja, mais favoráveis do que na TPP.
- Outros importantes setores estão incluídos na eliminação tarifária, tais como maquinaria, informática, bens de consumo diversos, químicos e produtos agrícolas, incluindo trigo, carnes bovinas, suínas, avícolas e frutos do mar; na área tabagista foi admitida a aplicação de salvaguardas específicas;
- inclusão de complexos dispositivos comerciais, com regras de origem, que vão além dos ditames regulamentados na OMC;
- eliminação de barreiras não tarifárias;
- abrangência sobre serviços, investimentos, propriedade intelectual, compras governamentais, além de dispositivos sobre solução de controvérsias;
- estabelecimento de diversos comitês para orientar os países a cumprir o conjunto de disciplinas acordadas em diversas áreas, incluindo proteção ambiental e tráfico humano e de drogas;
- coordenação para a aplicação das regras trabalhistas de cada país. Muitos outros detalhes serão mais bem conhecidos quando o United States Trade Representative (USTR) publicar o detalhamento de todo o acordo.
Na esfera política, o resultado está sendo encarado como uma vitória pessoal do presidente americano contra a vontade da maioria do partido Democrata, porém com o apoio dos republicanos que lhe concederam o "fast track", assegurando a primazia do Congresso americano para rejeitá-lo integralmente sem efetuar alterações específicas ou aprová-lo tal como está. Não obstante, especialistas opinam que, pelo menos nos EUA, a TPP dificilmente será aprovada antes de abril de 2016 em obediência às tramitações legais daquele país. Para entrar totalmente em vigor, será necessário, também, que ocorra a ratificação parlamentar dos demais congressos.
Especulações da mídia americana indicam que a TPP será um importante mecanismo para arrefecer as ações comerciais e financeiras da China nos países envolvidos. Contudo tais prognósticos terão de ser comprovados na medida em que os acordos que estão sendo negociados pela China com Japão e Coreia do Sul e de forma bilateral com a Austrália, além do que já mantêm com o Chile, tornem-se inócuos frente à amplitude da TPP. Consideram o acordo, também, importante fator de estímulo para agilizar as negociações do TTIP (acordo transatlântico de comércio e investimentos entre os Estados Unidos e a União Europeia), entendimentos, contudo, que têm implicações políticas e econômicas muito mais complexas do que a TPP.
A questão mais importante para o Brasil será avaliar até onde a TPP pode influir ou afetar o questionado imobilismo brasileiro em matéria de negociações comerciais com áreas mais desenvolvidas. Tal imobilismo é atribuído, por um lado, às dificuldades de locomoção do Mercosul em negociações conjuntas de maior porte e, de outro, às precárias condições competitivas dos bens industrializados em mercados mais sofisticados, mesmo se levarmos em conta a atual situação cambial favorecendo suas exportações.
A TPP tende a afetar os interesses brasileiros num amplo espectro. Na área dos parceiros latino-americanos, além dos acordos que Chile, Peru e México já mantêm com os EUA, a União Europeia e alguns países asiáticos, agora tendem a sofrer uma competição mais acirrada na TPP com a presença de Japão, Cingapura e até mesmo do Vietnã na área de informática. Até mesmo as commodities, que vêm sustentando a balança comercial do país, tendem a sofrer séria concorrência da Austrália nas exportações de açúcar, minério de ferro e carnes em geral. A situação pode tornar-se mais crítica quando o acordo bilateral daquele país com a China entrar brevemente em vigor.
Na verdade, deve-se registrar que o governo brasileiro tem acionado o setor privado para ajudá-lo na maior aproximação comercial com Peru e Colômbia, visando acelerar os cronogramas de desgravação tarifária nos ACEs 58 e 59 da Aladi e incluir novas disciplinas importantes ainda não contempladas neles, mas a tarefa não tem sido simples. Com o México, parece haver interesse recíproco de ajustar o insípido ACE 53 e o ACE 55 do setor automotriz à amplitude compatível com o tamanho das respectivas economias, mas o ganho brasileiro será apenas compensatório em relação aos diversos acordos que aquele país tem com o mundo desenvolvido.
Tal panorama pode tornar-se crítico na medida em que não há qualquer movimento político-institucional dos países do Mercosul em analisar a atual situação do bloco, confiando em que o eventual progresso das negociações com a União Europeia venha a suprir pelo menos parte da carência de relacionamento comercial com o mundo desenvolvido. No andar dessa carruagem tomara que o Brasil não esteja próximo de levar um xeque-mate.
Mauro Laviola é vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB)
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