UM EXEMPLO BOM E UM PÉSSIMO DE PROFESSORA
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UM EXEMPLO BOM E UM PÉSSIMO DE PROFESSORA


Isso é do meu Yearbook (livro registrando os alunos e professores de cada ano), mas juro que não fui eu que fiz esses rabiscos.

O Dia da Professora (vamos admitir, a enorme maioria das pessoas nessa profissão é mulher) passou e eu nem pra me lembrar dele. Mas, em homenagem posterior (eu ia escrever póstuma), vou lembrar de duas professoras que tive.
Lembrar numas, porque desta primeira que vou falar não me lembro nadinha. Nem nome, nem rosto, alguma característica marcante, nada. Lembro apenas que eu tinha sete anos e estudava na Escola Parque, no Rio. Hoje sempre que ouço falar na escola vem junto uma descrição, “escola de elite”, mas na época, obviamente, eu não sabia disso. E imagino que a escola deve ter mudado muito, porque nos anos 70, quando estudei lá, ela só ia até a sexta série. O lugar era lindo, cheio de árvores. O que mais lembro são as jacas. Sempre tinha jaca caída no chão. Enfim, um dia a professora levou a turminha pra uma aula ao ar livre, no meio da natureza da escola, e pediu pra que a gente desenhasse alguma coisa. Não sei se era homenagem à árvore, à natureza... Triste, até recentemente eu sabia contar essa história com mais detalhes. Mas o que lembro é que disse pra professora que eu não sabia desenhar direito, e perguntei pra ela se podia escrever um poema. E ela fez o que uma excelente professora deve fazer: não seguiu regras inflexíveis; pelo contrário, disse “Sim, fique à vontade”. Eu escrevi um poema, ela gostou, mostrou pra todo mundo, e esse foi o início da minha longa carreira poética, que durou até os meus dezenove anos, quando publiquei um livro, e depois, nunca mais. Se ela houvesse respondido algo como “Deixa de ser fresca, menina, e faz um desenho aí”, é bem provável que eu teria tomado gosto pela escrita do mesmo jeito—eu recebia muito incentivo em casa. Mas que esse foi um belo empurrão, não há dúvida. E tudo começou com um simples sim.
Agora o contraponto, e deste eu me lembro muito mais. Depois que a gente se mudou pra SP e tivemos uma ou outra experiência mal-sucedida com escolas particulares rígidas (o oposto da Escola Parque), minha mãe decidiu que deveríamos estudar numa escola americana. E fomos parar logo numa escola católica, a Chapel, que de liberal não tinha nada (mas a essa altura do campeonato ter contato diário com o inglês tava no topo das prioridades maternas). Não vou reclamar, porque depois, principalmente no high school, a escola revelou-se ótima, e era uma maravilha fazer amigos de tantas nacionalidades diferentes. Mas, se eu tivesse filhos, eles não estudariam lá. Primeiro porque a escola é caríssima, e eu não teria nem como pagar (sem falar que meus filhos estudariam em escola pública, porque acredito que educação de qualidade é um direito do cidadão). E segundo porque, ahn, se a família não é religiosa, por que colocar os filhos pra sofrer em colégio católico?
Mas eu divago. A Chapel (apelido pra Mary Immaculate School, capela, em português) tinha umas nove freiras quando entrei, acho. Todas davam aulas (uma até de Ciências, e ela era boa), e lembro que foi uma revolução quando, no final do meu tempo na escola, entrou uma freira brasileira, da Teologia da Libertação, e levou várias pra conviver com crianças pobres na favela, mas eu dr. jivago de novo. Eu lembro de uma freira louquinha, a Sister Benjamin, e de como um dia ela deu um tapa num menino que estava balançando a cadeira, e ele caiu pra trás. Mas o terror de todo o elementary school (séries iniciais, até a sexta série) não era ela, e sim a Sister Agatha. Havia duas sextas séries, uma com a Mrs. Crane, e outra com a nazi nun, a freira nazista, que foi o apelido carinhoso que eu dei pra Sister Agatha. Ela era americana-polonesa e tinha uma aparência hiper rigorosa de gente que não sorria nunca. E pequenos óculos nazistas, à la Caçadores da Arca Perdida (sabe o nazista que pega o medalhão, e a mão dele fica em carne viva?). Como ela tinha reputação de bater nos alunos, e como eu, com a minha sorte, não fui parar na turma da Mrs. Crane, meu pai foi falar com a direção da escola logo que soube que eu teria a Sister Agatha como professora. E avisou que, se a Sister encostasse um só dedo cristão em mim, ele a colocaria pra fora e processaria a escola. Ou algo do gênero. É muito, muito estranho escrever essas linhas com naturalidade, dizer “ela batia nos alunos” e ninguém fazer nada, e ela traumatizar turma após turma de crianças da sexta série e continuar lá. Imagino que hoje em dia bater em alunos não seja mais permitido. E não é por nada não, mas se você é pai, tá pagando uma grana preta pra escola, e vê que sua filha vai passar um ano inteiro tendo uma jararaca como professora, você não levaria a menina pra estudar em outro lugar? Não, porque ter contato diário com o inglês estava acima de tudo. Mas aquele ano foi um inferno. Aliás, encontrei um texto que escrevi pra algum curso no Chapel mesmo, já no high school (no início do high school, espero, porque o texto tá elementar, meu caro watson). Como minha memória estava mais fresca naquela época, vou traduzi-lo aqui:
Meu pior ano escolar. Acho que meu pior ano escolar foi na sexta série. Aquele ano foi difícil para mim e para meus colegas, principalmente por causa da professora. A professora era a Sister Agatha, e ela fez com que gostar das suas aulas fosse impossível. Toda vez que passávamos pela porta éramos tomados por um sentimento de medo. O que ela vai dizer sobre a maneira como estou vestida? Ela vai começar o dia brigando só porque esqueci um livro no meu locker? [armário que cada aluno tem, que fica do lado da sala]. Quem ela vai escolher pra brigar hoje? Portanto, íamos à aula sem nenhum interesse. Ela adorava matemática, então tínhamos que estudar matemática durante metade do dia. Ela odiava qualquer um que não entendesse o que ela explicava. Ela adorava humilhar as pessoas. Lembro que todo mundo chorou na classe dela. Ela tratava todo mundo tão mal que todos nós tínhamos medo e a odiávamos também. Lembro de uma vez, quando eu não entendi um problema de matemática. Ela começou a gritar comigo, a me insultar. E eu chorei. Por que ela tinha que humilhar as pessoas? Às vezes ela tentava bater em alguns alunos. Esse foi meu pior ano, mas também foi o pior de todo mundo que passou pela sua aula”.
O professor, corporativista, escreveu na minha redação: “Acho que não foi, porque alguém escolheu este ano como um bom ano de aprendizado porque a pessoa teve que estudar tanto”.
Eu não sou adepta do estilo exército de que pra se aprender alguma coisa é preciso sofrer. Sinto muito, acho que dá pra aprender tendo prazer, com paz e amor. Tenho a impressão até que se aprende mais num ambiente pacífico que num campo de concentração.
Bom, não sei o que aconteceu com a Sister Agatha. Ela torturou aluninhos durante mais alguns anos (meu irmão, inclusive, calhou de cair na classe dela também), e depois se aposentou, ou foi trabalhar numa penitenciária, sei lá.
Ah, mas só pra terminar este texto quilométrico num tom pra cima, vou relatar uma das piores perguntas que se pode fazer a uma turma de alunos. Não é piada. Essa eu presenciei num estágio de quinta série, de uma professora de inglês numa escola municipal em Joinville. Prestem atenção à pérola que ela disparou a seus alunos, após uma explicação: “Todo mundo entendeu tudo ou tem alguém aqui que não entendeu e eu vou ter que explicar tudo de novo?”. Sério, o que essa professora espera da vida? Que algum aluno levante a mão?




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