"MINHAS AMIGAS SÃO TODAS MACHISTAS"
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"MINHAS AMIGAS SÃO TODAS MACHISTAS"


A B. me enviou esta mensagem:


Oi Lola, escrevo esta mensagem porque não sei como agir. Nasci e cresci em um grande centro, onde morei até alguns meses atrás. Embora ainda não me definisse como feminista, sempre fui a favor de igualdade de direitos e outras bandeiras conhecidas, como o desejo de não ser mãe, o direito à escolha quanto ao aborto, a igualdade nas tarefas domésticas etc.
Há alguns anos conheci pela internet aquele que veio a se tornar meu marido e que pensa como eu sobre esses assuntos. Como resultado temos um casamento de parceria, onde os dois trazem dinheiro pra casa, cuidam da casa e das filhas (não humanas), e ambos são livres pra também ter sua vida individual, com hobbies e saídas com os amigos. Claro que sempre avisamos aonde vamos e a provável hora em que voltaremos, se vamos atrasar, mas, dentro dos parâmetros que definimos (casamento monogâmico), temos liberdade para fazer nossas coisas sem cobranças, cenas de ciúme, chantagem emocional...
Enfim, há alguns meses fui transferida pra uma cidade do interior. Meu marido veio junto. E eu levei um choque enorme com o quanto as pessoas aqui são machistas!  Alguns exemplos:
1) Meu marido conversando com alguns colegas de trabalho (todos homens) e comentando que também arruma a casa e, em geral cozinha (porque não sou fã), recebeu como resposta: “Tua mulher não limpa a casa e não sabe cozinhar? Pra que tu tem mulher então?!”;
2) No trabalho, o marido de uma colega a proíbe de sair sozinha (ela tem que mentir pra ir a happy hours com as outras mulheres da empresa), de fazer academia (“porque todos os homens vão ficar olhando pra você de roupa de ginástica”), de emagrecer, de trabalhar até mais tarde (liga de 5 em 5 minutos querendo saber se ela ainda tá no escritório). Em compensação, ele sai sempre que quer e nunca a leva, nem numa festinha de fim de curso (“só vai ter homens lá, amor”), chega de madrugada e bêbado, não lava um copo em casa nem faz nada pelo filho além de brincar... Ela está casada com ele há muitos anos, foi seu primeiro namorado, e ela já deixou escapar que “só casou com ele com medo de não encontrar ninguém melhor”;
3) Outra garota, que mora sozinha e se sustenta, ouve do namorado num domingo de manhã e na sua própria cama: “Pô, fulana, essa casa tá imunda! Você não vai levantar pra limpar não?”, sai correndo pra comprar e preparar comidas que ela não gosta só porque o cara tá a fim de comer tal coisa, e tem o dever até de adoçar o cafezinho que ele toma no serviço e entregar na mão dele (trabalham na mesma empresa), cozinha pros dois almoçarem durante a semana. Ah sim, e na casa dela, se não fizer o leite com Toddynho dele, ele não toma café da manhã (lembrei na hora da história do leite batido, e do mingal);
4) Outra ainda, recém casada, ouve do marido que deveria não só passar as roupas dele mas também suas cuecas. Ela, inclusive, é a que me tem deixado chocada mais vezes.  Faltando uma hora prum almoço entre mulheres que combinamos há um mês, o marido liga pra ela dizendo que não tem comida em casa pra ele (ele está desempregado), e que ela devia voltar pra casa pra preparar a comida. Por pressão das outras moças ela insiste em ir ao almoço, e ele briga e fica emburrado por dias. 
Outro dia, havíamos marcado um happy hour, e ela foi a contragosto dele. Pois ele não mandava mensagem de 5 em 5 minutos, querendo saber onde ela estava (ainda não chegou no barzinho?! Tá muito estranha essa história!), que horas ia voltar... Quando ela chegou em casa, às 21 horas, ele simplesmente não abriu a porta pra ela! Sim, a deixou na rua (ela só tinha a chave do apê, não da portaria) por quase meia hora; ela entrou no prédio com a ajuda de uma vizinha. Quando entrou em casa, teve que ouvir que “é claro que você estava com outro cara, que amigas porcaria nenhuma!" No fim das contas, depois de todo o escarcéu, ele pediu desculpas, disse que tinha exagerado, e ela perdoou. Se acertaram adivinha como?  Ela resolveu que "é melhor evitar" sair com as amigas, pra não criar mais briga. E eles não têm nem dois meses de casados!
Enfim, te contei tudo isso pra te perguntar: como agir nessa situação? Essas mesmas mulheres que passam por essas coisas enchem a boca pra falar mal do feminismo (“malditas feministas que queimaram os sutiãs, só ferraram com a nossa vida, porque agora estamos sobrecarregadas!”), e meio que “se orgulham” de suportarem esses absurdos, como se isso mostrasse como elas são fortes e “mais mulheres” do que as outras... outras tipo eu. 
Uma delas já chegou a duvidar da masculinidade do meu marido, pelo fato de ele cuidar da casa (“marido que cozinha?!? Hmmm, sei não, viu...”). No começo achei que, contando coisas da minha vida, elas pudessem ver que existem homens diferentes, que nem todos são machistas e, quem sabe, promover algumas mudanças. O resultado? Além da chacota, agora, quando elas comentam, e adoram generalizar tipo “homem é assim mesmo”, elas ainda me excluem: “Ih, seu marido nem conta, né, B.?”.
Aí eu fico sem reação, acabo parando de comentar qualquer coisa e só fico ouvindo as reclamações. Algumas vezes até tentei mandar textos daqui pra elas lerem, mas elas os ridicularizam! É como se fosse coisa de outro mundo, algo muito “pra você que é de cidade grande, não pra nós”. Fico angustiada, porque ver pessoas próximas a mim, por quem eu tenho afeto, serem tão pisadas, me faz ter vontade de fazer alguma coisa! Já pensei em apertar o “f*da-se, você é quem escolheu isso pra sua vida”, mas não consigo...
Fico me perguntando se elas gostam dessa situação, ou se enganam com coisas tipo “é o jeito de ele mostrar que me ama”. Você, que já morou em tantos lugares diferentes e viu tanta coisa, já esteve em situação parecida? Como proceder?



Minha resposta: Que barra, hein, B.? Parecem As Esposas de Stepford, com a diferença que suas amigas trabalham fora... 
Felizmente, nunca tive muito contato com mulheres machistas. Já vi, claro, mulheres que enfrentam abusos, mas elas fazem o possível pra sair daquela situação. A maior parte das pessoas com quem tenho contato mais próximo são feministas, ainda que não necessariamente se assumam como tal. 
Essas mulheres que vc descreveu tão bem foram educadas pra ser assim. Tudo vem junto no mesmo pacote: a ideia de que ser feminina é ter que aturar esses abusos, que homens são assim mesmo, que é melhor ter um homem que a destrate do que não ter nenhum, que ciúmes é demonstração de carinho, que serviço doméstico é coisa de mulher, e, claro, que o feminismo surgiu pra acabar com esse cenário de extrema felicidade em que elas se encontram. Ou senão que elas seriam felizes, se não fosse o maldito feminismo. 
É muito complicado mudar uma mentalidade dessas. Imagino que elas sejam jovens. Um dia, talvez, elas se cansem dessa submissão, dessa opressão, e se separem. Muitas vão se separar, pode ter certeza. Nessas horas, ao avaliar o porquê da necessidade da separação, talvez elas notem que aquilo que tinham não era um bom relacionamento. Algumas vão se revoltar e adotar outro velho chavão, "Homem nenhum presta!". Mas é bem provável que não virem feministas. Porque, tirando a generalização do "homem não presta", elas continuarão vendo o problema como individual, não como parte de um sistema. 
Não tem muito jeito, B. A revolta tem que vir delas. Enquanto elas só ficarem com essas reclamações pra animar roda de conversa, e não quiserem fazer nada a respeito pra mudar a própria situação, não há muito que vc possa fazer. Acho que responder com humor pode ser uma tática eficaz. Deve ser péssimo ver amigas de quem vc gosta numa situação assim, mas a atitude tem que vir delas. 
Será que elas já viram este estudo que mostra que pessoas feministas são mais felizes no amor? 
Parece óbvio, né? O seu relacionamento com liberdade, sem neuras, com compartilhamento de tarefas, certamente é muito mais feliz que o delas. Eu ia dizer que um modelo patriarcal desses que elas levam só deixa os homens felizes, mas, pela sua descrição, não tem homem feliz lá não. Não há felicidade em ter que constantemente vigiar e punir alguém. Ainda mais alguém que se ama. 




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