GUEST POST: PRECISO TOMAR AS RÉDEAS DA MINHA VIDA
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GUEST POST: PRECISO TOMAR AS RÉDEAS DA MINHA VIDA


Este é um daqueles emails que acabam com minhas defesas. Foi a A. que enviou.

Antes do seu blog, nunca tinha tido contato algum com assuntos feministas. Fui criada em um lar extremamente machista. Escuto desde pequena da boca do meu pai que eu não tenho querer, e quando havia alguma briga ou discussão por algo que eu havia feito (ou não) só quem falava era ele; eu nunca tive opinião sobre nada em casa. 
Minha mãe é uma mulher muito oprimida, meu pai a trata exatamente da forma que me tratava, ela só fica em casa, totalmente dependente financeira, psicologica, emocionalmente e em todas as outras formas que exstam de ser dependente de alguém. Ele a trata mal na frente de quem quer que seja, dá em cima de outras mulheres na frente dela, e ela sempre abaixa a cabeça e o defende.
Descrevi tudo isso pra eu mesma me explicar o motivo pelo qual sempre ter sido tachada de mal-educada e rebelde sem causa por ele (e claro, pela minha mãe).
Nunca aceitei essa de não ter opinião e de "Você não precisa trabalhar, ou sou o homem da casa e eu sustento todo mundo (mulher e filhas). Odeio com todas as minhas forças ser controlada financeiramente por alguém. É a forma mais simples da pessoa te controlar e "dizer" o que você vai fazer ou não, ter ou não. Pois tudo que precisa, tem que pedir!
Mas sobre meu clique, quando percebi que algo estava muito errado na minha vida: cresci dessa forma, doida pra sair de casa, e meu pai dizia que eu só saia de casa se fosse casada. Hein? Sempre precisamos de um homem para nos controlar?
Mas fiquei em casa até esse momento, o do casamento. Fora que, quando meu pai descobriu que eu não era mais virgem (fiz sexo pela primeira vez aos 18), ele me chamou de piranha, disse que eu era uma vergonha, passou semanas sem falar comigo.
Casei, aos 22. Engravidei, minha filha nasceu. Meu maridinho, até então um amor, se revelou o machista que é. Eu tinha que cuidar sozinha da casa, da minha filha e dele que, vamos combinar, parece aqueles adolescentes de 13 anos de tão bagunceiro. Fui chamada de inútil e burra por ele, pois eu não conseguia fazer essas coisas tão simples e ainda trabalhar fora! E quando ele reclamava que a casa não estava sempre limpinha e arrumadinha, e eu falava isso tudo, e falava que eu pagava as contas e ainda tinha que fazer tudo? Ele virava pra mim e dizia: pelo menos você faz alguma coisa!
Segundo ele, eu sou tão inútil, mas tão inútil Lola, que eu mereci apanhar, pela primeira vez, no dia 2 de novembro de 2011, com a minha filha, de na época 5 meses, no colo.
Vários episódios se seguiram depois desse, já fui jogada no chão e chutada porque eu queria ir à festa de confraternização da empresa que eu trabalhava e ele teria que ficar com a bebê pra mim. E ele não queria, então inventou uma besteira qualquer, como a louça estar suja, e me bateu por isso. Já levei murro por estar conversando com algum homem, e juro, pois EU sei das minhas intenções, que não estava conversando com segundas nem terceiras intenções, estava conversando como converso com você! 
Enfim, já fui humilhada, por diversos motivos, pequenos ou grandes, já tive os mais diversos objetos lançados contra mim, ameaças de morte, minhas coisas (celular, maquiagem, objetos de uso pessoal, roupas) quebradas ou rasgadas. Tudo na frente da minha filha. E se eu acordo de mal humor, ou quando acontece alguma coisa desse tipo e eu simplesmente não quero falar nem olhar na cara dele, eu sou mal agradecida, porque ele é o melhor homem do mundo, ele me sustenta (saí do emprego há um ano por não dar conta de fazer tanta coisa), porque não existe ninguém no mundo que vai cuidar de mim como ele cuida.
Ah, e todas as vezes que sou agredida é por minha culpa, eu que provoquei por que eu sou uma burra e tentei argumentar com ele. Não posso falar com ele quando ele tá com raiva. Ele diz que sou uma péssima mãe, uma péssima dona de casa, e no fim de tudo uma merda, não presto pra nada. E no fim do dia anda tenho que estar sorridente, doida de vontade de "ser mulher" pra ele!
O dia que disse pra ele que ele precisava era de uma empregada e de uma boneca inflável que não fala nada, e não de uma esposa, levei um murro no nariz.
Parei pra pensar no porquê disso tudo. Será que sou tão ruim a ponto de ter que passar por isso todos os dias? Saí de casa um dia, só com a roupa do corpo, sem nem fralda pra neném, por medo dele me matar ou machucar a pequena. Já tentei me matar, e pensei nisso várias vezes depois. Mas não tento mais, pois penso muito na minha filha. 
A mãe dele sabe de tudo, pois o dia que levei um murro no nariz, foi na frente da casa dela e eu chamei pra ela ver o que o filho dela havia feito (nesse dia achei que ele ia me matar enquanto voltávamos pra casa). Mas, como ele é o neném dela, ela não tá nem aí.
Ela me acha medíocre e egoísta por não querer ter outro filho! 
Foi uma luta pra eu conseguir voltar a trabalhar há duas semanas, pois tudo que eu arrumava o atrapalhava! Imagina se eu tiver outro filho? Vou morrer dentro de casa igual a minha mãe?
Não consigo sair disso Lola, não consigo denunciar, tenho medo! Dele, de ficar só, de não conseguir sustentar minha filha. Não tenho família, ninguém por perto...
Será que eu sou ruim mesmo e mereço isso? Será que eu sou uma merda, como ele tanto diz?
Comecei a trabalhar e todos os dias escuto dele: Quem mexeu com você? Você tá me traindo! Não posso falar com ninguém, que já estou me oferecendo! Isso me ofende, Lola! Sou casada com ele, apesar de tudo, não acho certo trair a pessoa e também não acho certo não falar com ninguém porque meu marido é doente, louco de ciúmes e ele pode me agredir e agredir o homem com quem eu esteja conversando!
Este foi um desabafo de uma feminista enrustida e medrosa!
Tenho muita dificuldade em me expressar por conta da forma que fui criada, e tenho medo de me "revoltar" e tentar mostrar quem eu sou por dentro e quem eu quero ser (independente, feliz, e mulher).
Acho que vou fugir! Rs
Amo ler o que você escreve, e me sinto como a conhecesse há vários anos, por isso me senti na liberdade de escrever tudo isso!
Beijos de alguém que um dia se acerta!

Minha resposta: Nossa, querida A., que coisa horrível, hein? Parece que vc, como tantas outras mulheres, simplesmente passou de uma situação opressora (com seu pai) pra outra (com seu marido). Vc está repetindo o padrão de vida da sua mãe.
Espero que vc saiba que isso que vc está passando é muito comum. Não acontece só com vc, mas com milhões de mulheres. É um problema seríssimo da sociedade em que vivemos.
Mas A., hoje em dia temos mais mecanismos de defesa que a sua mãe teve. A Lei Maria da Penha fez com que muitas mulheres que apanhavam caladas finalmente denunciassem seus maridos. Entendo que vc tenha medo, mas vc precisa fazer alguma coisa. Vá a uma delegacia e denuncie. Ele simplesmente não pode te bater, te ameaçar. Vc não é obrigada a ficar numa situação dessas. Ele terá de sair de casa e sustentar sua filha. Fim do casamento. 
Por favor, querida, nem pense em fugir, em suicídio, nada disso. Vc deve combater o machismo a que foi submetida desde que nasceu! Felizmente, vc não precisa mais lutar contra o seu pai. Agora vc não deve nada a ele, e ele, machista como é, até é capaz de ficar do lado do seu marido. Mas agora vc é adulta, independente, tem sua própria vida, e não precisa ser uma vida cheia de medo, opressões e humilhações. 
Não será fácil, mas vc pode sair dessa!

A: Passei por uma situação uns 3 ou 4 anos atrás... Uma amiga minha levou uma porrada do namorado dela no meio da rua (e na minha frente), na hora nós fomos até uma delegacia, com ela ainda sangrando e tudo mais. Fomos atendidas com total hostilidade! Os policiais, não sei por que, presumiram que nós éramos garotas de programa e que ela tinha apanhado de algum cliente! Como assim?
Demorou pra eles entenderem que havia sido o namorado que bateu, que eu era uma amiga, que não trabalhávamos com programa (e se fosse o caso, alguém poderia simplesmente chegar e nos agredir por isso?!), e além de ficarmos horas esperando pra fazer o B.O, eles perguntaram pra ela várias vezes se ela tinha certeza que queria registrar queixa, se não tinha sido só uma briguinha. Um babaca teve a cara de pau de falar a pérola "Ah, mas diz se você não provocou ele!". O ponto é que eu acho que muitas delegacias são compostas basicamente por policiais do sexo masculino, e quando procuramos pra fazer denúncia, eles são muito hostis.
Eu vou ter coragem sim de mudar isso que tá acontecendo comigo. Seu blog tá despertando muita coisa dentro de mim, tá me fazendo ver que eu não tenho culpa disso, de ser fisicamente mais frágil! Ah, mas tem hora que cansa isso de ser mulher!
Não sou menos que seu ninguém! Eu não só a mamãe de uma menina que amo, nem saco de pancadas de ninguém! Eu sou mulher e em breve tenho certeza que vou me livrar de tudo isso e serei feliz!
Você vai ver, logo logo vou te mandar um e-mail te contando que eu tô bem...
Mas que eu tenho muito medo que ele cumpra as ameaças de morte que faz, ah isso eu tenho... E muito!
Lola, só de ter alguém pra desabafar e que me entendeu e me deu força, já me sinto bem mais encorajada a tomar as rédeas da minha vida.




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