A MÍDIA NÃO REPRESENTA O NOSSO PODER
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A MÍDIA NÃO REPRESENTA O NOSSO PODER


Só recentemente arranjei tempo pra ver um documentário que foi lançado nos EUA com grande estardalhaço no ano passado. Estou falando de Miss Representation. Pra quem não percebeu, é um trocadilho entre Miss Representação e misrepresentation, ou seja, representação equivocada, representação falsa -– no caso, da mulher na mídia. O doc trata estritamente da mídia americana, mas, como a gente copia tanta coisa dos EUA, quase tudo que é discutido no filme parece muito familiar. Recomendo fortemente Miss Representation, e pretendo dedicar alguns posts ao filme, já que ele traz inúmeros dados e vários depoimentos de gente reconhecida em suas áreas. Ele está disponível com legendas em português.
A diretora e roteirista Jennifer Siebel Newsom começa contando sua história. Apesar de privilegiada, ela perdeu sua irmã mais velha num acidente, tentou ser duas para substituir a perda, foi violentada por um treinador, e passou a ter distúrbios alimentares que consumiram dois anos de sua vida. Fez o filme pra sua filha.
O ponto central do documentário é que, em todo lugar na mídia, a mulher só é valorizada por sua aparência. Não importa sua profissão, é só o poder que ela alcança através de sua beleza (uma beleza irreal para a maior parte da população) que é avaliado. Que mensagem isso passa às meninas? E aos meninos? Eles vão aprender a valorizar a mulher por alguma outra coisa que não seja a aparência?
O jeito como a mídia trata mulheres no poder é irresponsável, pra dizer o mínimo. E o documentário lembra que, em 2008, ano das últimas eleições americanas, duas mulheres concorreram (ou quase). Uma foi Hillary Clinton (que durante longos meses disputou com Obama para ser a candidata democrata, e perdeu), tratada como vadia castradora, masculina, baranga. A outra foi Sarah Palin, candidata a vice pelos republicanos, pintada como linda, feminina, inspiração para masturbação. E as duas foram execradas. Ficou a lição: não importa o tipo de mulher, mulher na política será sempre insultada. As meninas que acompanharam todo o processo (em outras palavras, que ligaram a TV em 2008) entenderam essa lição. Qual menina vai querer se sujeitar a esse tipo de abuso? Ela vai pensar dez vezes antes de sonhar com um cargo público de poder.
E isso a gente vê no dia a dia: quantas garotas e mulheres se calam por medo de chamar a atenção para sua aparência? O pior é que nós mesmas somos duríssimas umas com as outras. Como é mais difícil analisar o que é dito, nos centramos no corpo de quem fala. O cabelo não está nos conformes? É ele que vamos criticar. A mulher com voz é gorda? Oba, trollfest! A moça que fala se enquadra no padrão de beleza? Sem problema: vamos diminuí-la por ela ser bonita (logo, fútil), ou acusá-la de anorexia.
Desse jeito, não é de espantar que 17% das adolescentes americanas se auto-flagelem. Isso é assustador, e é algo que eu nunca tinha ouvido falar até uns tempos atrás. Não sei, mas não parece ter sido um fenômeno muito comum na minha adolescência. As meninas se odeiam tanto que se cortam. Ferem sua própria pele. Há um depoimento comovente no documentário de uma adolescente chorando por sua irmã se odiar tanto que ela mutila a si mesma. É alarmante: vivemos numa sociedade que faz tantas meninas se sentirem tão mal com elas mesmas que elas se punem fisicamente (pra não falar o que fazemos conosco mentalmente). E aceitamos isso numa boa. “Dói muito ver minha irmãzinha sendo machucada pela mídia. Quanto tempo vai levar até que alguém tome uma atitude?”, pergunta a garota, aos prantos.
Lembrem-se, meninas: apesar do que a mídia, sua família, suas amigas e amigos te dizem todo santo dia, vocês não estão aqui pra enfeitar o mundo. Vocês não são candidatas a Miss Universo. Suas vidas não dependem de vocês serem consideradas lindas. Vocês podem (e devem) buscar poder de outras formas que não tenham nada a ver com a superfície. Pensem em todas as mulheres que mudaram o planeta um pouquinho. Nenhuma era top model. Nenhuma era miss. A única miss que entrou pra história foi Martha Rocha. Ela virou nome de bolo. E nem é de chocolate.




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