Crise da mídia: nadando na superfície
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Crise da mídia: nadando na superfície


Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:

O título do seminário, realizado quinta-feira (21/2) em São Paulo, era “Caminhos da sustentabilidade: como as novas tecnologias estão impactando o modelo de negócio da imprensa, o fazer jornalístico e o relacionamento com o mundo empresarial” – uma iniciativa da consultoria Mega Brasil.

Na plateia, jornalistas, diretores de empresas e instituições encarregados das relações com a imprensa e representantes de assessorias de comunicação. Encarregados dos debates, dirigentes dos três diários de circulação nacional e do principal jornal de economia e negócios do país.

Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do Estado de S. Paulo, que estava ocupado na recepção à blogueira Yoani Sánchez, enviou um vídeo, com o qual foi aberto o evento, mas se limitou a conjecturar sobre o que seria um empreendimento sustentável de comunicação. Para ele, a sustentabilidade da imprensa diante do desafio das tecnologias digitais só pode ser garantida se o produto jornalístico atender os interesses da cadeia de valor do jornalismo. Citou como exemplos desse complexo de interesses o leitor, os jornalistas, anunciantes, acionistas, gestores e – acrescentou posteriormente – o governo e os poderes da República.

Sustentabilidade, em resumo, na sua opinião, é gestão de recursos, mas depende de uma sintonia entre as partes interessadas. “Um empreendimento é sustentável se a crença das partes coincidir com a crença do todo”, afirmou.

Gandour citou a cobertura das eleições de 2010 e o noticiário sobre o julgamento da Ação Penal 470 como exemplos em que esses interesses estariam convergindo. Em outras palavras: para o diretor do Estadão, o ideal é buscar a homogeneidade, a fidelidade a um conjunto específico de valores, que se torna ainda mais relevante diante da fragmentação das plataformas de publicação.

Vera Brandimarte, diretora de Redação do Valor Econômico, procurou separar a atividade jornalística e o modelo de negócio da imprensa, observando que o que deve diferenciar os jornalistas é o comprometimento com a independência e a seriedade da informação. Lembrou que o dilema segue sendo o fato de que o número de leitores dos jornais de papel cai em praticamente todo o mundo, enquanto aumenta o público nos meios digitais, mas a receita de publicidade não acompanha as necessidades criadas pela produção jornalística de qualidade. Ela informou que a redação do Valor é a origem de 60% dos custos da empresa, enquanto nos jornais chamados generalistas essa proporção é de 35% em média.

Commoditiesde informação

Sérgio Dávila, editor executivo da Folha de S. Paulo, e Pedro Doria, editor executivo do Globo, falaram sobre as estratégias dos dois jornais para enfrentar o desafio das mudanças tecnológicas.

A Folha trata, desde 2010, de juntar a redação tradicional com os núcleos de produção para os meios digitais, unificar a produção de conteúdo para as diversas plataformas e cobrar pelo produto jornalístico em qualquer formato. Para Dávila, os protagonistas da internet no Brasil cometeram um pecado original ao deixar de cobrar pelo acesso aos conteúdos desde o início.

Na opinião de Doria, isso não foi um erro, mas resultado da circunstância em que a internet se desenvolveu, e várias iniciativas de cobrança acabaram em fracasso. “Não se esqueçam que Gutemberg morreu falido”, brincou.

Doria e Vera Brandimarte se aproximaram mais do problema da diferenciação entre os conteúdos oferecidos ao público, uma questão central no desafio enfrentado pela imprensa tradicional. O editor executivo do Globo observou que 80% do material publicado pela imprensa generalista é commodity, ou seja, informação comum que está por toda parte.

A diretora do Valor afirmou que uma das grandes ameaças para os jornais são as coletâneas de notícias feitas pelas empresas de clipping eletrônico. “Em Brasília isso se tornou uma praga em todos os ministérios e órgãos públicos. Essa é a maior pirataria”, afirmou.

Para Pedro Doria, o maior problema é a polarização política estimulada pela internet, que dificulta o diálogo entre as pessoas. “Nos meios homogêneos, os mais puristas se destacam, o que aumenta a polarização e a radicalidade”, observou.

No entanto, questionados sobre a homogeneização das redações e do público leitor de jornais, os representantes da imprensa foram enfáticos em discordar. Com exceção da diretora do Valor, que vê pouca diferença nos conteúdos dos principais diários, os demais rejeitaram essa interpretação.

Cabe ao observador registrar: se 80% do noticiário é commodity, se as cartas de leitores parecem o grito uníssono de uma torcida de futebol, onde estaria a diversidade?




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