CRÍTICA: EU SOU A LENDA / A lenda de um gênero que ficou no passado
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CRÍTICA: EU SOU A LENDA / A lenda de um gênero que ficou no passado


Na entrada de “Eu Sou a Lenda”, o maridão disse que o fato de eu ir ao cinema gripada é como se a vida imitasse a arte, porque eu iria contaminar todo mundo. Segundo ele, “É mais ou menos como o filme, com a diferença que agora o pessoal sabe como a epidemia de zumbis começou”. Eu falei pra ele me deixar em paz ou não lhe daria bola nem que ele fosse o último homem da Terra, tipo o Will Smith. Essa nova versão de “Lenda” já começa com uma explicação: a Emma Thompson descobre a cura pro câncer. Três anos depois, os curados do câncer viraram zumbis, espalharam o vírus, e acabaram com o planeta. Restou o Will, e muitos mortos-vivos que só se aventuram à noite.

Esta é a terceira versão do livro de 1954 do Richard Matheson (o mesmo que escreveu os contos que viraram “Encurralado” do Spielberg e vários episódios de “Além da Imaginação”, como aquele do monstrinho na asa do avião, além de “O Incrível Homem que Encolheu”). Eu gosto do livro, mas ele tá cheio de defeitos. Parece que todos os vampiros da cidade não têm mais nada pra fazer fora se reunir na frente da casa do protagonista. Apenas um fala, e mesmo esse só grita o nome do herói. E é ridículo que, com o mundo em frangalhos, nosso carinha só pense em sexo. Ele vê mortas-vivas e pensa, “Hmm... Que saudades!”. Mas toda a sequência em que ele conhece um cão é emocionante. E, lógico, qualquer parte do livro é muito superior à adaptação de 1971, que levou o título de “A Última Esperança da Terra” (“The Omega Man”), em que o Charlton Heston faz um cientista que passa a maior parte do tempo sem camisa. Os vilões são mais vampiros hippies e albinos que zumbis. A única coisa minimamente instigante é o Charlton dirigindo por uma Los Angeles abandonada, e o romance interracial entre ele e uma negra com penteado afro. Acho que desde os anos 90 o pessoal decidiu refilmar “Lenda”. Redigiram montes de roteiros (eu li um feito pro Schwarzenegger, já pensou?), escalaram astros, mas as negociações não avançaram. Sobrou pro Will, que, em termos de bilheteria, deve ser o maior astro de cinema do mundo depois do Tom Cruise (até uma atrocidade como “Hitch – Conselheiro Amoroso” fez dinheiro).

Sou fã do Will desde “Homens de Preto”. Se “Lenda” é um sucesso, financeiramente falando, é por causa do seu carisma. Mas não suporto as entrevistas pra imprensa. Alguém pergunta: “Como foi trabalhar com sua filha?” (durante uns dois minutos). E ele diz que foi maravilhoso, que ela tem um talento natural. Mesmo que não fosse verdade, o que ele diria? “Ah, foi um pesadelo! Ela não nasceu pra coisa. Nem deve ser minha filha. Inclusive, ainda bem que só tenho dois rebentos. Um eu coloquei em 'À Procura da Felicidade', e a outra aqui. Talvez agora me dêem um tempo”.

Apesar do empenho do Will, “Lenda” decepciona. O melhor de “Extermínio” era a chance de ver Londres vazia. Agora é Nova York. Vamos falar a verdade: essa é disparada a maior atração. No entanto, o filme não tem muito clima, e o final é extremamente religioso (pra agradar a direita cristã?). A gente vê que os mortos-vivos são fortes e rápidos, mas eles não falam e não parecem ter alguma inteligência. Então como armam uma armadilha pro herói? E ter um sobrevivente “escondido” perde a graça. É mais charmoso que todos os outros seres saibam onde ele vive e queiram a sua caveira. E que ele sobreviva por ter montado um hiper castelo tecnológico à prova de zumbis. Aliás, será que sou a única mulher na Terra que acha que esses zumbis e animais gerados por computador se parecem exatamente com zumbis e animais gerados por computador? Tô me tornando especialista em identificar de longe um efeito especial digitalizado. Aqueles veadinhos todos foram aproveitados de algum videogame? E não gosto que façam testes com animais, nem que seja pra salvar a humanidade, da qual não sobra grande coisa mesmo. Tem uma brasileira na jogada, a Alice Braga (que tá em “Cidade de Deus”). Mas melhor nem falar nela porque meio que entrega a história. Digamos assim, se todo mundo é um bando de zumbi gerado por computador, o Will é o último homem da Terra, e a Alice não interpreta o cão ou um zumbi, mencionar a presença de outra pessoa estraga a surpresa. Portanto, pobre Alice. Ela aparece num mega arrasa-quarteirão hollywoodiano e a crítica finge que ela não existe.

Ou vai que o problema de “Lenda” não seja com o filme em si, mas com todo um gênero? Um sujeito da revista “Entertainment Weekly” escreveu uma análise interessante sobre por que a ficção cientítica é o gênero que mais precisa de uma refrescada – não existem idéias novas. Aproveitam uma história de 50 anos atrás como “Lenda”, relançam “Blade Runner” (de 82) num estojo com cinco DVDs, insistem em repetir Aliens e Predadores, e logo logo soltam o remake de “O Incrível Homem que Encolheu”... Realmente, olhar pro futuro viria a calhar.


P.S.: Tá, talvez você conheça o Richard Matheson dos filmes acima, relacionado ao gênero da ficção cientítica. Mas sabia que “Em Algum Lugar do Passado” também é baseado num de seus livros? Pode ser que eu esteja exagerando, mas esse romance melodramático de 1980 marcou toda uma geração de mulheres (as coisas que marcam nem sempre são de boa qualidade. “Flashdance”, por exemplo, é inesquecível). Lembra do Christopher Reeve voltando no tempo pra encontrar a amada, Jane Seymour? É brega e água-com-açúcar, mas recomendo essa volta ao passado.






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