Não que a gente deva ficar com peninha desta comédia romântica e ir vê-la só por ser brasileira, como se assim a gente cumprisse com nosso dever cívico. “Lisbela” custou R$ 4,5 mi, o que deve ser gorjeta de personal trainer de produtor de Hollywood, mas que é uma grana considerável pros padrões daqui. Foi dirigido por Guel Arraes, que é, já faz tempo, o nome mais aclamado da TV. Está sendo lançado no país em grande escala, com distribuição da Globo Filmes e da Fox, em 220 salas. Ou seja, é quase uma tentativa de arrasa-quarteirão. E a história é fofinha. Nada original, mas fofinha. É sobre a Débora Falabella, uma donzela que adora cinema e que acaba se apaixonando pelo Selton Mello, um aventureiro meio cafajeste que vai de cidadezinha em cidadezinha arrebatando corações. Numa delas, ele conhece biblicamente a Virginia Cavendish, despertando a ira de seu marido, um matador de aluguel interpretado pelo Marco Nanini. Mais ou menos isso. Parece que a trama de Osman Lins foi um especial televisivo no início da década passada (a Giulia Gam fez Lisbela), que depois virou peça com a Virgínia, mulher do Guel, no papel-título.
O que “Lisbela” tem de mais gracioso, além da trilha sonora – a voz do Caetano é sempre lírica –, é a homenagem que faz ao cinema. Quem é cinéfilo sente-se compelido a aprovar o filme. Mas, apesar do quê de “A Rosa Púrpura do Cairo”, a comédia corre o risco de deseducar o público. Então eu queria esclarecer: querido espectador, só porque a Lisbela conversa animadamente no cinema, isso não quer dizer que você deve fazer o mesmo. No filme, ela comenta as sessões que assiste, mas entenda, isso é um recurso narrativo. Ia ficar estranho se ela analisasse as cenas só na saída. Pelamordedeus, o comportamento dela não justifica o de mais ninguém. Sugiro até que Lisbela vire sinônimo da galera tagarela. A partir de hoje, recomendo que a gente olhe pro grandalhão que atende o celular no meio de um filme ou que não pára de narrar os fatos pra namorada e grite, em coro: “Cala a boca, Lisbela!”.
Aliás, essa verborragia é minha maior queixa ao filme. “Lisbela” beira o exercício repentista, quase um cinema de cordel. Os atores, todos ótimos, sem exceção, gastam saliva falando demais. O único personagem mais caladão, o do Nanini, é o que se sai melhor. Tem uma hora que a Vírginia diz num sotaque pernambucano: “Tu só qué sabê di conversá”. Seria bom se o Guel tivesse entendido o recado e cortado um pouquinho os diálogos, deixando que a gente aproveitasse mais as imagens. Não é à toa que a fala mais divertida é também a mais curtinha, quando Selton Mello dispara um “de novo”.
Pode ser que esse excesso de palavras (ou o de edição) seja o que torne “Lisbela” um tanto cansativo lá pelo meio. Mas o terço final é redentor, e qualquer filme livre, leve e solto que termine com uma música cantarolando “Amor é filme e Deus é espectador” já tem todo o meu apoio. Agora, convém registrar a crítica de Cláudio Assis, diretor de “Amarelo Manga”. Ele reclama que o governador de Pernambuco foi ver a estréia de “Lisbela” em SP, mas faltou à exibição de “Amarelo” em pleno Recife. O que determina essa distinção, só o poder da Globo Filmes? Tomara que “Amarelo Manga” também passe aqui.