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CRÍTICA: PEARL HARBOR / Faça amor, não faça guerra
Estreou aquele filme cujo lema é "aquilo que não nos mata, nos deixa mais fortes". Eu já tinha ouvido a frase, mas pensei que ela se aplicava apenas a ocasiões em que encontramos vermes na comida. Não é que este é também o tema de "Pearl Harbor"? Bizarro este pessoal do norte. Não vou pichar o arrasa-quarteirões da vez. Primeiro, porque eu não sou disso, de ficar espinafrando Hollywood. Ademais, porque "Pérola" não é despudoradamente ruim. É melhor do que "Armageddon", concebido pela mesma dupla destruidora, digo, criadora, composta por Michael Bay e o Midas-ao-contrário Bruckheimer. "Pearl Harbor" nem é tão patriota assim. Tirando as bandeirinhas de praxe e um ou outro discurso inflamado do tipo "Deus ajude quem desafiar a América", ele não declama todo seu amor pelos EUA. Acho que eles nem cantam o hino. Tudo bem, é o ponto de vista do vencedor, mas é o vencedor narrando um episódio em que ele foi surpreendido e arrasado pelo inimigo. Aconteceu em 1941, sessenta anos atrás: enquanto a Europa era castigada por Hitler, os soldados do Tio Sam tiravam férias no Havaí. Os japoneses, aliados dos nazistas, bombardearam a tal base militar no Pacífico e forçaram a entrada americana na Segunda Guerra. Desculpe gastar linhas contando o que está em qualquer livro de História, mas a juventude hoje em dia não sabe nem o que é livro, quanto mais História.Como ninguém comparece ao cinema para aprender alguma coisa, "Pérola" coloca um fundo romântico na trama. É algo como um triângulo amoroso, e é chato pra chuchu. Aviador ama moça, morre, moça envolve-se com melhor amigo de aviador. Aí o aviador interpretado pelo Ben Affleck volta vivo e... Eu disse vivo? Ato falho. Se você já viu o Ben atuar, sabe que é só uma figura de linguagem. Até o Elvis está mais vivo que o Ben. Nas magníficas e sempre sinceras entrevistas para a imprensa, descobri que Ben e seu comparsa passaram por um árduo treinamento militar limpando latrinas para prepararem-se pro papel. Valeu a pena, como se pode conferir.
O que eu acho legal é que "Pérola" custou 140 milhões de dólares, fora a divulgação, e os atores revelam que diminuíram seu cachê por patriotismo?! Patriotismo seria jogar uma bomba na Casa Branca, isso sim. Opa, esqueci – eles já fizeram isso. Mas naquelas vezes ("Independence Day" etc), o presidente escapou.
Talvez não tenha me identificado com o filme porque Pearl Harbor não me diz nada. "A Um Passo da Eternidade" trata do tema com muitíssimo mais propriedade. Houve uma hora em que um japonês fala "temo que tenhamos acordado um gigante adormecido", e naquele momento eu me antenei. Por um breve instante, imaginei que eles estivessem mencionando a gente aqui, do berço esplêndido (e escuro, em sua versão neoliberal). Pense só, se fizéssemos uma produção sobre os pracinhas do FEB, os americanos seriam obrigados a assisti-la? Então por que temos que ver tudo que conta a história deles?
Os ianques crêem piamente naquilo que é proferido ironicamente em "Um Peixe Chamado Wanda" – que, se não fosse por eles, estaríamos todos falando alemão hoje (e não inglês, como se deve). Só o Benigni acredita nisso de que os americanos nos salvaram do Terceiro Reich. É claro que a intervenção deles foi fundamental, mas e os russos? No fundo, a guerra acabou mesmo quando nossos heróis do norte explodiram a bomba atômica em Hiroshima, em retaliação a Pearl Harbor. Como Hollywood não ousa fazer filme louvando bomba nuclear, faz filme que mostra os EUA sendo empurrados pra guerra. Uma guerra, aliás, que eles têm tudo pra comemorar, pois foi graças à ela que eles se consolidaram como potência mundial.
Mas os tempos atualmente são de dominação pacífica, apesar de não muito discreta. Pra não ofender os japoneses, "Pérola" tem 55 minutos a menos por lá. Veio a calhar: imagine a onda de suicídios que três horas de "Pearl Harbor" não podia deflagrar? Eu mesma, durante a exibição, contemplei um harakiri. Mas não se preocupe, fiel leitor, que eu sou da época do "faça amor, não faça guerra".
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