Com uma trama tão hitchcockiana assim, por que “Plano” não funciona totalmente? Um dos problemas é a escalação da Jodie. Lembra de “Louca Obsessão”? Aquele suspense é um estouro porque era estrelado pela então desconhecida Kathy Bates, e a gente não imaginava do que ela seria capaz (ninguém acreditaria numa Meryl Streep, por exemplo, quebrando as pernas de um cara com uma marreta). A Jodie a gente conhece, e confia. Sabe que ela não alucinaria ter uma filha. Se ela afirma que a guria tava no avião, quem é a gente pra duvidar de uma super atriz vencedora de dois Oscars? É como ter certeza absoluta que a Jennifer Connelly nunca faria algo contra a filhinha em “Água Negra”. Se essa ambigüidade existisse de verdade, se a gente suspeitasse que a Jodie pirou na batatinha, o terror seria maior. Além disso, em “Plano” a gente enxerga a Jodie com a garota. Os passageiros e a tripulação podem ser uns ceguetas, mas nós vimos. Tudo bem, a Jodie até aparece passeando com o marido morto nos créditos, só que isso não é suficiente pra abalar nossa convicção na heroína.
Mais uma coisa. Notou como em todo filme com a Jodie ela faz uma mulher solteira, separada, viúva, geralmente com filhos? Ela quase nunca tem um par romântico (mais um motivo pra gente idolatrá-la). Em “Plano”, pra naturalizar essa situação, não há um só casalzinho louco pra transar no banheiro do avião. Acho que o único casal do filme senta em fileiras separadas.
Agora, por que os vilões, que a gente desconhece até o final quem sejam, selecionam a Jodie pra atormentar? Parece que é porque ela vive de planejar aviões, então ela tá ciente que há mais lugares pra procurar uma menininha desaparecida do que na cabine do piloto. Como disse o maridão, a gente mal sabe que existe a primeira classe. Eu posso ser ignorante e tal, mas que negócio é esse de uma portinhola no banheiro dar num painel de controle que possibilita trazer pânico pra todos? Na minha próxima viagem, se eu não ficar entalada nessa portinhola, me aguardem.
Bom, tal qual “Mar Aberto”, a lição de “Plano” parece ser: antes de sair por aí andando em qualquer meio de transporte, faça-se notar. Fica aí a dica. Mas minha dúvida cruel mesmo é descobrir se suspenses como “Plano” e “Vôo” passam nos aviões. Eu lembro até hoje que “Rain Man” foi proibido porque o Dustin Hoffman declamava um longo monólogo sobre acidentes aéreos. Ele só aceitava viajar pela Qanta, que possuía um histórico impecável. A única companhia que passava o filme era a... Qanta, lógico.