CRÍTICA: STOP-LOSS / Ou porque não me ufano dos EUA
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CRÍTICA: STOP-LOSS / Ou porque não me ufano dos EUA


Voltem pra casa de vocês, rapazes.

Sei que agora que o mundo renovou as esperanças nos EUA, não é uma boa hora pra criticar Stop-Loss - A Lei da Guerra. Vi o filme em abril em Detroit, fiz montes de anotações, e estava só esperando que ele estreasse no Brasil pra poder escrever a crítica. Mas aí Stop foi direto pra dvd. E até o final do ano quero “desovar” os textos de algumas produções pendentes. Então vamulá.
Stop, pra quem não sabe, chamou mais a atenção por levar o selo MTV e contar com Ryan Phillippe, Joseph Gordon-Levitt, e Channing Tatum no elenco (reconheço que só consigo identificar o Ryan). É sobre um soldado que volta da Guerra do Iraque e é recebido com festa na sua cidade no Texas. Após cinco anos lutando, ele acha que cumpriu seu contrato e seu dever com o país, e não quer retornar ao Oriente Médio. Mas o mandam de volta porque precisam de soldados, e a guerra continua (e ainda bem que o McCain perdeu, porque ele disse que, dependendo dele, a guerra poderia continuar por mais cem anos).
Li entrevistas com a diretora Kimberly Peirce (foto) se gabando de ter feito um filme com visão masculina, de ter se integrado tão bem naquele mundo másculo, e só pensei: mas que droga é essa? Pra que dar dinheiro a uma diretora mulher e lésbica, se ela vai nos brindar com a mesma visão que todos os diretores homens, brancos e héteros de Hollywood não se cansam de promover? Desculpe pôr tanta pressão, Kimberly, mas você, como membra de duas minorias (mesmo que uma delas seja maioria em termos numéricos, se bem que obviamente não em termos econômicos ou políticos), sabe bem que uma obra artística representa muitos dos valores e crenças de quem a concebeu, e que esses valores são em grande parte construídos pela nossa vivência. Uma mulher lésbica tem uma vivência e, portanto, uma visão de vida, muito diferente da maior parte dos homens héteros. Por isso é positivo pra todo mundo que tenhamos diretoras, escritoras, artistas, inclusive críticas de cinema, que pensem um pouquinho fora do padrão, que percebam coisas que podem passar em branco pra quem tá dentro da norma. Mas aí temos uma diretora cujo primeiro filme, Meninos Não Choram, causou grande impacto (e dificilmente poderia ter sido feito por um homem branco hétero), que demora nove anos pra fazer o segundo, e quando chega a hora, após boa expectativa, entrega algo tão mainstream (prefiro o termo malestream)? Qual a vantagem?
Tá, li em entrevistas também que o assunto não deixa de ser pessoal pra Kimberly, porque seu irmão lutou na Guerra do Iraque e foi stop-lossed (ou stop-lost? Nem sei. É esse processo de impedir que o soldado deixe a guerra). Mas o filme é bem bananão, sabe? E tô de saco cheio de produções americanas sobre o Iraque. Pra mim deu. Porque eu encaro tudo isso como a maior patriotada, pró-guerra, super-pró-USA, e a mídia de direita considera todo e qualquer filme de guerra com exceção de Rambo como anti-guerra e anti-americano. Essa mídia, por sinal, celebrou que Stop tenha ido tão mal de bilheteria. Segundo ela, o filme arrecadou uns doze dólares em seu fim de semana de estréia. Piadas à parte, o público americano não aguenta mais ouvir falar nessa guerra. Não basta a MTV bancar um filminho com atores jovens e bonitos pra atrair público. Outro dia, vi o podre do porta-voz da Fox News, Bill O'Reilly, argumentar que não, não é que o público não suporta ouvir falar da guerra que a Fox segue promovendo com todas as forças, é só que esse público, tão inteligente, não suporta mais a propaganda liberal de Hollywood, e que a gente vai ver quando fizerem o primeiro filme patriota sobre a guerra do Iraque. Ué, pensei que O Reino já fosse mais ou menos isso. O que pode ser mais patriota que todos esses filminhos vangloriando os bravos guerreiros? Ressuscitar John Wayne?
Stop mostra o de sempre: soldados americanos lutando valentemente no Iraque, criando laços de amizade entre eles pro resto da vida, perdendo alguns companheiros, e sofrendo um monte com isso. A diferença é que a gente ouve alguém dizer que é profissional. Ou seja, claro que ele tá lá lutando porque é homem e ama seu país e acha que está fazendo a coisa certa e gosta de libertar outros povos, nem que pra isso tenha que liquidá-los, mas ele está sendo pago pra isso. Ao contrário da Guerra do Vietnã, em que todo homem jovem corria o risco de ser convocado (e não podia recusar; as duas únicas opções eram ir pra cadeia ou fugir do país), com o Iraque o exército ainda é voluntário. Certo, pode-se discutir o quanto há de voluntário no fato que o único jeito de um jovem negro ter dinheiro pra cursar uma faculdade e, assim, melhorar sua vida, é indo prum outro país matar gente (não que haja personagens negros em Stop). Mas digamos que ele ainda tem opções. Não é forçado a ir, como foi no Vietnã. Logo, é muito difícil eu sentir pena de alguém que tá sendo pago pra matar e torturar e que, por mim, não deveria estar lá. Além disso, por eu não ser americana, alguma coisa acontece no meu coração: não sei porquê, mas não acho que a vida de um americano valha mais que a vida de um iraquiano, de um francês, de um brasileiro, nem de um argentino. Quando os americanos falam com horror no número de mortos na guerra, eles só se referem ao número de soldados americanos. São militares da maior potência da história do mundo atacando um frágil país pra defender interesses americanos. Nenhuma palavra sobre civis iraquianos, mulheres e crianças, que deram o azar de morar num lugar que os americanos transformaram em zona de combate.
O filme faz crer que essas pobres almas americanas voltaram marcadas pro seu glorioso país. Agora bebem, gostam de brigar em bares, batem nas mulheres, adoram atirar. Ahn, agora?! É, esses rapazes do Texas eram todos santos antes. Não foi alguém dessa estirpe que estuprou e matou a protagonista de Garotos não Choram? Essa gente não aprende a atirar com cinco anos de idade? Não sofre uma lavagem cerebral desde a mais tenra idade pra servir o país em qualquer guerra?
Sou mulher, sul-americana, subdesenvolvida, feminista, pacifista. Ainda bem que tenho uma visão diferente da de um crítico americano. Não dou a mínima pra que soldados americanos morram nas guerras que fazem. Eles não deveriam estar lá. São eles os invasores. Não são meus heróis.Espero que o Obama acabe com essa necessidade de "heróis" americanos...




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