DA VEZ QUE ESCAPEI DE UM LINCHAMENTO – PARTE 1
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DA VEZ QUE ESCAPEI DE UM LINCHAMENTO – PARTE 1


Como recordar é viver, vou contar uma história real sobre o maior barraco que um texto meu já gerou. Aconteceu há uns seis ou sete anos. Na época o jornal, além de publicar minhas críticas de cinema, ainda dava espaço pra crônicas levinhas, onde eu podia falar do que quisesse. Não foi um tempo fácil não. Eu escrevia pro jornal, trabalhava como coordenadora acadêmica e professora numa escola de inglês das 2 da tarde às 10 da noite, e cursava Pedagogia na ACE (Assoc. Catarinense de Ensino) das 7 e pouco da matina ao meio dia. Parte de um estágio eu tive de fazer no horário do almoço, porque era o único tempo que sobrava. Eu não gostava muito do curso e tava lá só pelo diploma. É que eu queria seguir adiante com um mestrado pra finalmente poder estudar assuntos prazerosos, mas pra isso era preciso concluir um curso superior, o que eu não fiz quando deveria, na minha adolescência (tinha cursado dois anos de Propaganda). Jovens que me lêem, não façam o que eu fiz. Terminem a faculdade, mesmo que ela pareça ser uma perda de tempo. Estudar na adolescência, de preferência morando com os pais, sem precisar se auto-sustentar, é muito mais fácil do que quando se é adulto.

Enfim, embora eu não gostasse muito de Pedagogia, era boa aluna. E o estágio foi uma experiência interessante. Tínhamos que observar e lecionar não sei quantas horas de aula em cada série, da primeira à quarta. Eu tinha certeza absoluta que aquele seria o único momento na vida em que daria aula pra criança. Não era o que eu queria, nem quero. E então publiquei uma crônica a respeito. Pode ler, não dói.


ESTÁGIO SABOR ABACAXI

Estou no último ano de Pedagogia e agradeço aos céus por isso, mas há desvantagens. A maior delas é que chegou a hora do temido estágio. Temido porque tenho que ficar numa sala com trinta pestinhas. Aula eu já dou, de inglês, e lecionar adultos ou adolescentes parece um paraíso em comparação. Aliás, pra evitar uma corrida em massa às escolas de Joinville, com centenas de pais desmatriculando seus filhos, quero me comprometer publicamente que não vou dar aulas no futuro. Só no estágio, e porque preciso. E no estágio tem supervisão; dificilmente os aluninhos serão contaminados por alguma idéia subversiva. Não se preocupem.

Um dia, ainda na observação, a professora decidiu fazer uma salada de frutas com a classe. Adivinha quem ficou com a incumbência de descascar o abacaxi? A estagiária, é claro. Eu. Não queria confessar que jamais havia chegado perto de um abacaxi inteiro antes. As crianças sentiram o drama e fizeram uma roda em volta para ver como é que se cortava um. Ou melhor, como é que não se cortava. Sou um perigo com facas.

Agora estou estagiando na terceira série. Um aluno quis insistir comigo que uma das nações mais populosas do mundo era... o Chile. Nada adiantou eu dizer que o Chile é minúsculo. As crianças me impressionam por duas coisas: uma, como elas não têm noção de quantidade. A outra é como, tendo que decidir entre duas opções, elas sempre escolhem a errada. Já havia pedido pra elas chutarem a população do Brasil, e as apostas variavam entre mil e um milhão. E o menininho com a convicção que o Chile, sim, que era enorme. Tive que contar-lhes que, em número de habitantes, campeã era a China, depois a Índia, depois os EUA, depois a Indonésia, depois a pátria amada idolatrada salve salve. Eles quiseram saber quantas pessoas havia em cada país. Sem problemas; sou muito boa em cultura inútil. Falei que havia uns 270 milhões lá nos States, e um aluno replicou: “Agora tem menos. Depois dos atentados...” Pois é, já estou chamando Herodes de titio.


Ok, pode não ser a crônica mais inspirada do século 21, mas eu jamais poderia imaginar a repercussão que teve. O texto foi publicado no jornal num dia da semana, quarta, eu acho. Minha editora comentou algo comigo, por email, que havia uma cartinha de protesto contra a crônica. Até aí, normal. O jornal volta e meia abria espaço pra “direito de resposta” de quem se sentia injuriado (tipo, quando pichei Shrek, um carinha do sindicato dos jornalistas pediu minha caveira). Mas com uma crônica dessas levinhas ainda não tinha acontecido. Reli a crônica. Até hoje, sinceramente, não consigo entender a comoção. Mas eu quase fui linchada. Não perca o capítulo 2 e a parte 3, o final.





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