GUEST POST: "MEU PAI ACHA QUE NÃO ME DOU O RESPEITO"
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GUEST POST: "MEU PAI ACHA QUE NÃO ME DOU O RESPEITO"


A C. me enviou este email:

Não sei se você lembra de mim. Te escrevi no outro semestre, sobre uma situação triste que rolou comigo. O ex-namorado que terminou e começou a namorar uma amiga minha, todos colegas de trabalho, uma verdadeira novela mexicana com requintes de machismo dos outros, que queriam ver o sangue da menina, e não o dele. Lembro que na época você disse que publicaria meu relato no blog quando eu já estivesse com um novo amor. 
Naquele dia eu dei risada, porque achava que isso não ia rolar tão cedo. Mas cá estou eu há quase três meses feliz da vida, namorando um cara ótimo, maravilhoso e feminista. 
Hoje eu queria falar sobre algo que aconteceu comigo ontem. E olhando pra esse fato, tudo aquilo que rolou com o ex-namorado parece minúsculo.
Sendo mulher, já passei por situações vexatórias. Nunca sofri abuso sexual, ou pelo menos nunca fui forçada a fazer sexo. Mas o "básico" acontece com todas nós, né? Olhares, palavras chulas no meio da rua, mãos bobas no ônibus quando ainda nem se tem idade pra entender o que aquele toque significa, mãos bobas no ônibus quando já se tem idade pra entender o que aquele toque significa. O de sempre. Mas nada, nada, nada disso se compara a o que eu tive que ouvir ontem.
Explico: uma grande amiga minha se formou, e me convidou para ir ao baile com ela, na minha cidade natal, onde não moro mais. Como não quis criar qualquer problema em casa, fiquei com o meu namorado em um hotel. No domingo, no almoço em família, na frente da minha mãe e do meu irmão, meu pai começou um discurso que eu tenho até dificuldade de entender:
"Você dormiu de ontem pra hoje com o seu namorado? Então, se vocês estão dormindo juntos, vocês são casados? Ele é seu marido? Ele é meu genro? Porque para permitir que vocês tenham esse convívio é preciso ser marido e mulher. Eu sei que você faz o que bem entender porque é dona do seu nariz, mas eu sinto que, como seu pai, devo falar."
Senso comum machista
em ação
Tenho 25 anos. Passei em primeiro lugar numa das melhores universidades do país, fui uma das melhores alunas da turma, comecei a trabalhar no dia em que apresentei minha monografia pra banca. Sou fluente em dois idiomas estrangeiros e já fiz dois intercâmbios. Me sustento sozinha e, talvez por ter iniciado minha vida sexual na faculdade, longe de casa, nunca precisei ter esse tipo de papo com meus pais. Também nunca tive DSTs, nem suspeitei que estivesse grávida. E ainda assim, acredito que mesmo se eu tivesse sido a adolescente problema e tido uma vida universitária completamente desregrada, não é papel dele meter o bedelho na minha vida sexual, tampouco julgar o meu caráter pelo meu comportamento sexual.
Eu não quis argumentar, porque sei que meu pai é muito conservador (é médico, ateu, e contra o aborto, o que eu nunca entendi). Eu só disse que não gostaria que ele se referisse ao meu namorado como meu marido, porque quem estabelece o que nós somos um do outro somos nós dois, e não ele, que está de fora.
E aí minha mãe tentou colocar panos quentes, e meu irmão disse que isso não tinha que ser conversado. Meu pai quis voltar ao assunto que tanto o incomoda: "Já falei com o seu irmão que é uma falta de respeito ele dormir com a namorada dele. Se ele a ama tanto, se quer mesmo se casar com ela, ele tem que respeitá-la. E com você é a mesma coisa: você precisa se dar o respeito".
Sabe, Lola, eu sou uma feminista tranquila e esperançosa.
Eu acho que se a gente conversar, as coisas podem ir mudando pouco a pouco. É claro que machismo me revolta, mas sou que nem você: acredito que as pessoas geralmente têm salvação. E foi o que eu argumentei com ele: eu não acredito nisso de se dar o respeito, acredito que sou dona do meu corpo e das minhas decisões, que eu respeito as opiniões dele, mas que eu não sou dele para ele decidir o que é certo ou errado pra mim. E ainda disse que nunca, nunca havia sido tão desrespeitada na vida quanto naquele momento, e que ele não deveria, nunca mais, tocar naquele assunto comigo.
"Você está retirando minha liberdade de pai. Você viu que errou e agora está me atacando para abafar o seu erro."
"Qual foi o meu erro?"
"Quer que eu repita? Você não se deu o respeito."
Nisso meu irmão e minha mãe já tinham se levantado da mesa, revoltados. Eu também saí, porque não vi solução. Meu pai é muito complicado. Na família dele, é assim: você ofende uma pessoa no dia e se senta à mesa com ela no outro, tira fotos e manda pro grupo, como se nada tivesse acontecido. Vai acabar que nem a mãe dele, que de tanto ofender e magoar os filhos, morrerá sozinha. Ele não se vê fazendo isso, e, pouco a pouco, afasta o meu irmão e eu.
É muito difícil amar uma pessoa que fala tanta bobagem. Dá vontade de gritar: cala a boca, eu te amo, cala a boca! E o mais louco é que eu não tenho um pingo de remorso por todos os homens que já beijei e transei. Não tenho remorso por ter transado com meu namorado na primeira noite. Tomei todas essas decisões consciente e feliz porque eu estava mandando no meu corpo. É muito bom ser livre. Toda a argumentação do você-não-se-dá-o-respeito me parece apenas patética.
Fico preocupada com a minha mãe, que fica desnorteada, começa a falar em divórcio. Não sei se é essa a solução. Não sei nem se tem solução. Acho que é só medo de ser a catalisadora desse processo.
Pra mim, essa situação é razoavelmente simples, porque moro sozinha e porque tenho plena consciência de que a loucura, a falta de limites e o machismo são dele. Eu não tenho nada com isso, e acho que de agora pra frente essas coisas devem entrar por um ouvido e sair pelo outro. Fico pensando nas inúmeras mulheres que já te escreveram, contando relações de abuso muito mais sérias do que essa. Acho que tive muita sorte nessa vida, Lolinha. Sorte que todas nós merecemos e, infelizmente, poucas temos.




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