GUEST POST: ABANDONEI A SEITA E ESTOU LIVRE
Geral

GUEST POST: ABANDONEI A SEITA E ESTOU LIVRE


A. me mandou este relato:

Oi Lola, faz pouco tempo que conheço seu blog, mas ele já abriu minha cabeça pra muitas coisas e me fez reconhecer e entender várias situações que vivi. Queria dividir um pouco da minha história, que deve ser parecida com a de tantas outras, mas acho que é isso que nos une.
Nasci em uma comunidade alternativa liderada por um ditador pedófilo, uma seita constituída por jovens que eram atraídos pela promessa de sexo livre onde não teriam que trabalhar. As mulheres saíam às ruas pra conseguir comida, dinheiro, qualquer coisa, e muitas eram incentivadas por esse líder a se prostituirem em troca de "novas almas para Jesus". Foi assim que eu fui concebida. Nunca conheci meu pai biológico, nem sei o nome dele, e ele também nunca quis saber de mim nem da minha mãe. 
Tenho outros 4 irmãos e um pai de criação que amo muito, e moramos nessa seita até meus 6 anos. Apanhávamos muito de qualquer um que se achasse no direito. Éramos abusados sexualmente pelos adultos, e minhas irmãs nem dormiam à noite pra me proteger. Mas mesmo assim com 4 anos (nem sei como me lembro), um rapaz de 18 me chamou pro quarto dele e me ofereceu chocolate pra deitar na cama dele e brincar de avião. Lembro de estar sem roupa de bruços e algo encostando em mim, do resto eu não lembro.
Saímos dessa seita depois que meu pai encontrou vários hematomas no meu irmãozinho de um ano.
Me sentia no paraíso vivendo uma vida normal, mesmo me sentindo um ET por não saber nada sobre o mundo real, porque vivemos enclausurados na seita.
A época de escola foi a melhor da minha vida, me sentia livre e tinha a sensação de que poderia ser tudo o que quisesse. Me imaginava uma adulta bonita, independente, sem filhos e morando com uma amiga.
Com 15 anos tive meu primeiro namorado; ele tinha 21 e era virgem. Depois de 4 meses de namoro tivemos nossa primeira vez, e eu fiquei grávida. Tentei abortar tomando chás que só me fizeram vomitar por dias. Achei um lugar que vendia Cytotec, mas não tinha dinheiro pra comprar. Depois que contei pra minha mãe e disse que queria abortar ela concordou e fomos num médico que faria, mas depois de ver o ultrassom com 3 meses já não tive mais coragem.
Tive minha filha e fiz tudo o que era esperado de mim, virei dona de casa aos 16, nunca mais saí, me afastei dos amigos e fui morar com a minha sogra. Foram os piores anos da minha vida. Eu era deprimida, não saía de casa, tinha medo do mundo, me achava um lixo. Não aguentei, disse que queria me separar, voltei pra casa da minha mãe. Era como se pudesse respirar de novo. 
Dois meses depois, por dó, voltei com meu marido, que era todos os clichês machistas já citados aqui: mulher tem que cuidar da casa, dos filhos e dane-se. Nunca me ajudou e ainda ficava horas me torturando psicologicamente para que eu fizesse sexo. Ele dizia que eu era frígida, cheguei até a procurar terapia. Nesses dias de sermão sobre sexo eu era vencida pelo cansaço e fazia só pra não ter que ouvir mais. Depois chorava e me sentia usada e vazia. Foram muitos anos assim, ficamos juntos por 11 anos.
Mas um belo dia resolvi cuidar de mim e voltar a dançar, que é uma das minhas paixões. Entrei pro grupo de corrida, conheci uma porrada de gente nova. Me sentia viva, feliz, bonita. E isso incomodava o marido, que começou a falar que eu não era boa mãe e estava renegando meus filhos (tenho 2). Eu chorava muito com as acusações dele e quis me matar inúmeras vezes.
Conheci uma mulher, por quem me apaixonei, e ela me fez ter a coragem pra por um fim no meu casamento. Implorei pro meu marido por favor me deixar ir, me libertar. Não foi nada fácil, exigiu muita coragem, mas fui firme e segui em frente.
Hoje moro com minha esposa e filhos, ganho meu próprio dinheiro, tenho tempo pros meus filhos, e nunca, nunca mais senti culpa por nada!
Ele foi morar com uma mulher e está numa relação abusiva onde se sente sufocado e inferiorizado. Esses dias ele me pediu perdão por ter sido tão ruim pra mim e que hoje ele sabe o que eu passei e que qualquer vida é melhor que essa.
Nunca podemos julgar ninguém, porque o mundo dá muitas voltas. Nenhuma verdade é absoluta e todos estamos aqui pra aprender, e nos reinventarmos a cada dia.
Me descobrir uma mulher forte é maravilhoso, e essa sensação de empoderamento é indescritível Eu verdadeiramente amo ser mulher!

Meu comentário: A., que história horrível! Sabe que, por coincidência, convivi com uma moça com o mesmo nome que o seu, que também vivia numa comunidade alternativa (e cristã)? Acho que era a mesma coisa que você diz, não sei: eles eram missionários, rezavam muito, só podiam se casar entre si, tinham muitos filhos, e muito cedo, eram adeptos de homeschooling etc). 
Não sei se há casos de abuso sexual naquela comunidade.
Bom, o importante mesmo é que agora você está bem com sua esposa, seus filhos, sua independência! Parabéns pela sua reviravolta. 

A., de novo: Então, sobre a seita, eu acho que é igual à dessa moça que você conhecia. 
Tínhamos homeschooling sim, e nunca saíamos de dentro da casa. Rezávamos muito, os adultos falavam em "línguas" nas reuniões espirituais. Cada um tinha um nome fictício que escolhia, e todos tinham muitos filhos. Tudo isso ainda existe, e é mundial. Convivíamos com gente do mundo inteiro e todos éramos alfabetizados em inglês. Todos tinham tarefas domésticas, tudo era dividido, você não podia ter nada só seu. 
A pedofilia foi abolida com o tempo, acho que perceberam que era errado, mas o líder, que era um velho americano nojento, mantinha relações sexuais com a filha, e a esposa dele com o filho, que de tantos traumas acabou matando sua babá e se suicidou. Ninguém saiu de lá sem traumas. 
Éramos expostos a sexo desde muito cedo, pois dormíamos sempre com um casal de adultos, tipo, vinte crianças e um casal, e eles faziam sexo todas as noites, e trocavam de parceiros. 
Então às vezes você via sua mãe com outros caras ou seu pai com outras mulheres. Cada filho era de um pai, assim como é na minha família.
E eu descobri que meu pai não era meu pai biológico só com 19 anos. A conversa foi assim:
Mãe: Filha, preciso te contar uma coisa. Seu pai é gay!
Eu: O quê? Como assim? Mas ele é realmente meu pai?
Mãe: Não filha, não é! O seu pai é alguém lá que eu nem sei o nome.
Imagina minha felicidade nesse dia, né.
Depois descobri que meu pai sempre foi gay e tinha entrado pra essa seita pra tentar se "curar". Ilusão. Mas tenho uma relação ótima com meu pai.
Eu acho que apesar dos pesares eu me saí bem, e não fico lamentando o passado, porque tô muito feliz com o presente.
Os únicos problemas agora são lidar com a filha pré-adolescente que me culpa pela separação e acha que eu destruí a família para ser lésbica. É foda viu. Mas eu supero, já superei tantas outras coisas.
Lola, muito muito obrigado por me ouvir! Parabéns pelo trabalho que você faz, por criar esse espaço onde todas as mulheres podem se sentir seguras e acolhidas, sem ser julgadas. você não sabe como é reconfortante. Por favor, não pare de fazer o que faz!




- "fui Criada Para Ter Medo Dos Homens"
A L. me enviou este email: Eu sempre fui muito machista, criada por uma família bem conservadora (especialmente por parte de pai), e nem sequer percebia o quão perigoso isso pode ser. Mas agora eu leio o seu blog e outros de vez em quando, tento aprender...

- Guest Post: Estupro NÃo É SÓ Coisa De Homem
S. me enviou este relato devastador: Sempre achei que o feminismo era uma coisa nata em nós mulheres. Olha que ignorância. Achava realmente que se o feminismo é a busca pela nossa liberdade e igualdade. isso seria óbvio para todas nós -- como não?Mas...

- Guest Post: O Ano Mais Longo Da Minha Vida
N, que hoje tem 22 anos, me enviou este relato de um relacionamento fadado ao fracasso desde o começo.  Comparando o meu caso aos outros, o meu parece bem besta, mas não deixa de ser algo que me afetou, que machucou, e eu imagino que só não...

- Guest Post: Meu Namorado NÃo Queria, Mas Fiz Um Aborto
Enquanto isso, no Uruguai... Recebi este relato da L. em agosto. Meu nome é L. e tenho 22 anos. Há um mês fiz um aborto. Me descobri grávida uma semana antes de fazer o procedimento. Uma gravidez já bastante adiantada (estava com sete semanas)....

- O Que Queria Ter Dito Antes Do Seu Adeus...
Há seis anos tive o primeiro sonho com você. Onde me apresentava seu filho e me pedia para cuidar dele quando você se fosse. Lembro de acordar angustiada e chorando muito. E a saudade que sentia de você naquele dia ficou imensa. Naquela época já...



Geral








.