GUEST POST: MEU DESPERTAR PARA A EMPATIA
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GUEST POST: MEU DESPERTAR PARA A EMPATIA


O G. me enviou este texto:

Queria te contar um algo que aconteceu comigo num domingo recente. 
Sabe, eu sempre li seus relatos e guest posts, e desde muito tempo eles foram me moldando, abrindo meus olhos para o preconceito machista enraizado na sociedade. Muitas vezes tento ficar atento às opiniões dadas das pessoas ao redor, publicidade, comentários e piadinhas. Mas até então eram só palavras, nada de ações perceptíveis. 
Apesar de ler sempre o seu blog, não sei se sou frio demais, mas minha empatia não chegava à alma, simplesmente eu lia, me emocionava às vezes, me impressionava às vezes, mas tudo isso não estava perto de mim. Pareciam as notícias de um jornal. Somos frios e apáticos porque estamos acostumados a ler isso todo dia. Tá, até aqui parece que eu sou um babaca, mas calma, eu tive a minha experiência e é ela que quero te contar. 
Sabe, sou um rapaz cis, branco, homossexual, tenho namorado, amigos, tudo lindo e ótimo. Isso me garante (às vezes) um pouco de paz quando preciso sair sozinho para ir ao centro da cidade, ou voltar -- sou estudante universitário numa cidade grande. Mas como gay, meu principal temor é a homofobia das ruas. Morrer apanhando. Isso me faz ser muito ansioso quanto a minha segurança. Minha casa parece um presídio, com grades e grandes muros, mas mesmo assim já foi assaltada. Eu sou um completo medroso em questão de segurança.
Bom, mas a situação que aconteceu no domingo foi completamente diferente pra mim. Não foi homofobia. Eu tinha acabado de almoçar com meu namorado num restaurante, e estávamos voltando cada um para sua casa. Como moramos em bairros diferentes, cada qual pega um ônibus diferente, num ponto diferente. E por ser domingo, os ônibus são mais demorados. Bom, fui eu então ao ponto mais próximo esperar o ônibus, como já tantas vezes havia feito: ficar sozinho no ponto de ônibus, escutando música com os fones de ouvidos, aguardando o horário. 
Normalmente eu sempre faço algo para me distrair, já dancei no ponto de ônibus sozinho, já cantei embromation, e nesse dia eu fiquei observando os carros que paravam no semáforo da esquina, onde o ponto de ônibus é localizado. Sempre um casal, uma velhinha, uns caras, motos, ônibus. Sou tentado a observar pessoas também por que gosto de escrever, então fico imaginando o que cada pessoa pode estar fazendo ou pra onde está indo. 
Mas normalmente não encaro diretamente as pessoas que estão dentro dos carros. Observo sem ser observado. E quando elas se viram para me olhar, desvio o olhar. Só que numa dessas, um cara, dentro de um carro preto, óculos raiban, parou no semáforo, logo na minha frente, e ficou me encarando. Até aí, ok, nada de mais, porque eu também o observava. O semáforo abriu e ele dobrou a esquina. Mas algo me chamou a atenção e logo imaginei que esse tiozinho daria a volta no quarteirão e voltaria para me encarar. Me levantei e olhei a rua ao lado para ver se ele não tinha estacionado por ali, mas não -- graças a deus. 
E aí ele realmente voltou. Veio devagar para pegar o semáforo fechado. O vidro do carro estava fechado. Eu, claro, sabia que era ele pelo vidro da frente. Olhei o vidro, virei o rosto, fiquei escutando minha música. Não ia encarar porque eu já sabia o que ia acontecer. Pensado e feito. Ele abaixou o vidro do carro preto e disparou: "Quer dar um passeio?" Eu, de olhar desviado, virei, tirei os fones de ouvidos e gaguejei: "Não." Voltei com os fones de ouvidos, desviei o olhar e fitei o horizonte, paralisado, com um medo que eu nunca tinha sentido antes. 
Tentei permanecer imóvel, tentando não ouvir o que ele dizia, focando na música que tocava, e tentando não me descontrolar, não virar o rosto. Mas e se ele apontasse alguma arma? E se ele descesse do carro? E se acontecesse algo? Meus olhos já estavam marejando com esses meus pensamentos quando o sinal abriu e ele novamente dobrou a esquina. Então saí do transe, pronto para, caso ele estacionasse o carro, sair correndo na outra direção, para qualquer lugar longe dali. Mas ele não estacionou, seguiu e foi. E eu fiquei ali, com meus mais novo medo, perguntando "O que foi isso? O que aconteceu? O que eu fiz?". 
Como um estalo me vieram as várias vozes dos guests posts lidos no seu blog com aquele mesmo temor. As cantadas na rua, aquele julgamento alheio, a história da menina que tomou o ônibus e o motorista não deixou ela sair. Senti na pele o que todas vocês, mulheres, sentem. Esse medo de não poder ficar em paz, em segurança, esse medo de que não existe segurança. Isso me foi tão impressionante, um caso tão banal perto dos já lidos pelo blog, que eu achei que compartilhar isso poderia até mesmo despertar a ira da mulherada: "Como você ousa comparar essa sua historinha com as outras bem mais sérias que aconteceram com a gente?" 
Mas bem, isso que me aconteceu me provocou realmente essa empatia que me faltava, esse sentimento de que pode acontecer com qualquer um, qualquer uma, e que isso é um grande mal a ser combatido. Não sei o que eu poderia fazer para ajudar o feminismo, mas sei que, se mesmo antes eu já me considerava um feminista, hoje, depois de ter passado por isso, me considero feminista mais que nunca. Só não sei como posso fazer minha parte nisso, pois refletindo depois sobre o acontecido, não sei como seria se eu tivesse nascido mulher. Acho que, com certeza, seria bem mais corajosa.




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