GUEST POST: OI, PRAZER, SOU ANA, 17 ANOS
Geral

GUEST POST: OI, PRAZER, SOU ANA, 17 ANOS


Mês passado, recebi um email de uma menina muito simpática, a Ana, do Rio Grande do Sul. Como fiquei absolutamente fascinada pelo email, perguntei se podia publicá-lo como guest post. E ela disse que sim, mas que então queria incluir algumas coisinhas... e ficou gigantesco. Como não tenho coragem ou motivo pra cortar uma delícia dessas, decidi publicá-lo em duas partes. E, como ela começa um tópico num parágrafo e retorna ao tópico dez parágrafos depois (hum...parece familiar), tive que fazer alguns reajustes mínimos. Mas é tudo dela. Que fluência, que leveza! Eu queria muito dizer que a Ana sou eu aos 17 anos, mas duvido que eu tivesse essa maturidade, essa certeza do que eu era e do que eu não era, do que queria e do que não queria. Enfim, eis aqui a primeira parte do guest post. Deliciem-se!

Muito prazer, meu nome é Ana, tenho 17 anos. Acompanho seu blog há algum tempo. Já pensei muitas vezes em escrever pra você, mas sempre acabava mudando de idéia – porque eu sou daquelas que não nasceu pra escrever duas linhas, sabe? Eu com um teclado ou papel e caneta sou um risco... eu escrevo pra caramba, pra caramba mesmo!
Mas aí eu li o post de março de 09, “Sim, eu quero queimar sutiã”, e não pude me aguentar. Então, me desculpe por torrar a sua paciência desse jeito, eu sei que esse e-mail vai acabar sendo quase um livro e que você provavelmente tem muitas outras coisas pra fazer; mas se você tivesse um pouco de paciência, eu ia gostar de trocar uma idéia. Só pra deixar o meu depoimento pessoal sobre a vida de uma feminista.
Nunca me dei muito bem com toda a história de ser mulher. Na verdade, quando eu era pequena e estava muito distraída correndo por aí eu não ligava; mas eu tenho que dizer que desde que entrei na adolescência isso se tornou um saco. Do nada vieram com uma história de que eu tinha que passar uns pós coloridos na cara, torrar meus cabelos na chapinha, usar uns brincos compridos que machucavam as minhas orelhas... O que, na minha singela opinião, não fazia sentido nenhum. Seria exagero se eu me comparasse a um vaso de flores? Porque era exatamente assim que eu me sentia – uma coisa vazia que serve como ornamento. Alguém me explica porque eu devia gostar de depilação quando eu posso economizar tempo e dinheiro lendo um livro?
Sabe, sou filha de uma mãe solteira. Minha mãe comeu o pão que o diabo amassou nas mãos do meu pai, mas enfim. Ela deu a volta por cima e com muita garra me criou. Modéstia à parte, ela fez um ótimo trabalho. Eu não devia me gabar, mas eu sempre fui o exemplo a ser seguido. Responsável, competente, inteligente, notas 10 pra dar e vender. Meu cérebro sempre foi a prioridade; eu fui criada pra ser independente, madura e justa. Minha mãe sempre abominou todo o tipo de preconceito e sempre me incentivou a questionar, a ter opinião. E ela própria era o exemplo perfeito disso.
Então quando todas essas coisas deixaram de importar, foi muito confuso. Sim, porque esse dia chegou. Agora minha mãe anda desolada porque eu não cuido direito do meu cabelo ou porque meu esmalte descascou. Eu cheguei a ouvir, num recurso desesperado, que se eu não emagrecer não vou conseguir emprego. Certo, o mundo está mesmo louco a esse ponto. Mas ter que ouvir isso da minha própria mãe? Da pessoa que mais tem influência sobre mim no mundo? Eu sugeri a ela que talvez entrar nos padrões, ser gordo ou magro, devesse ser escolha de cada um. A resposta: "O mundo não funciona assim!". Sinceridade comovente...
Que outras mulheres queiram ser bonitas não me irrita. Mas ser obrigada a ser bonita, ou a ser o que os outros acham que é bonito, isso me irrita demais. Não quero a extinção da vaidade, quero a opção de gostar disso ou não. Por que eu tenho que me submeter a uma série de coisas que eu não gosto de fazer, se ninguém tem nada a ver com a minha vida? Não gosto de maquiagem, DEAL WITH IT! Eu devia poder andar por aí de cara limpa (como fazem os homens) sem ser tachada de desleixada.
Parece que desde que eu entrei na adolescência, as coisas viraram de cabeça pra baixo. Adeus ética, adeus coerência, adeus ser você mesma. Vale tudo para ser aceita. Arriscar perder a vida numa mesa de cirurgia por um motivo estético, pode. Ser feminista, não. Não li uma linha sobre o assunto, mas dizem que as feministas querem matar os homi!
Eu acho isso tudo tão estúpido. Mas não precisa ser um gênio pra perceber que ninguém a minha volta concorda com isso – tenho uma amiga que não descansou até fazer uma cirurgia pra aumentar o bumbum, porque se sentia a criatura mais infeliz do mundo sem uma bunda (que é uma parte vital do corpo, a gente sabe). A mãe dela quase pôs o mundo abaixo quando soube, fez uma baita pregação religiosa sobre "o valor da vida"... Depois mudou de ideia quando viu o resultado: resolveu que queria, ela mesma, fazer uma. Tinha uma prima que me seguia pela casa quando eu era pequena, me mandando parar de correr porque se eu caísse os machucados podiam deixar cicatrizes (definitivamente, essa devia ser a prioridade de qualquer menina de 4 anos – evitar cicatrizes. Se divertir? Quem precisa disso?!). E conheço uma senhora, que tem quase 70 anos, que faz dieta porque se acha muito gorda (anorexia na terceira idade. Vai por mim, É possível).
Então eu fico de boca fechada porque se começar a dar opinião na ordem natural das coisas (que inclui mulheres que não vivem sem bunda e têm medo de gordura e da gravidade) eu vou ser vista como a louca, a rebelde, a sapata...
E quer saber? Eu fiquei com cicatrizes nos meus joelhos. Tenho toneladas delas por todo o corpo, aliás. E eu as amo, me lembram da melhor fase da minha vida (mas minha prima ainda me olha com aquele olhar superior, “eu te avisei...”).
Me pergunto, de que adianta usar salto alto, maquiagem e chapinha? Pra quê fingir que eu tenho 5cm a mais, olheiras a menos e cabelo liso se na verdade eu não sou assim? Um banho, e já era. Se eu acho inútil, por que tenho que usar?
Meu problema não é estar fora dos padrões. O meu problema é não querer entrar nos padrões. É achar que os padrões são imbecis. E não conseguir convencer ninguém disso.
Leia a segunda parte do guest post da Ana.




- "o Que Fazer Diante De CrÍticas RidÍculas?"
A C. me fez essa pergunta: Estou escrevendo porque ontem passei por uma situação um pouco chata entre família. Eu não soube como agir. Parece que quando vem de amigos é mais fácil você ignorar, mas quando é família, pessoas com quem você se...

- Guest Post: Minha FamÍlia, Meus Piores Inimigos
O triste relato da L.: Você precisa saber o quanto me ajudou e o quanto sou grata por você. Tenho 22 anos e minha até então jornada aqui não foi fácil, não é apenas drama como algumas pessoas me dizem.  Aos 12 anos eu comecei a sentir as...

- Guest Post: A Eterna Luta Contra Os Cabelos Cacheados
A Rebecca me enviou este email: Eu já fiz muita coisa erradaQueria começar dizendo que meu feminismo tem tudo a ver com você e com a descoberta do seu blog. Só tenho a agradecer milhões de vezes. Me envergonho de dizer que já fui machista, já...

- Guest Post: Quer Que Eu EmagreÇa? Pergunte-me Como
"Gosto de vc como vc é". E nem precisa ser o Colin Firth pra falar isso Ana, uma simpática e inteligente moça de 18 anos, vem fazendo o maior sucesso com seus comentários. Selecionei um que ela deixou no guest post sobre gordofobia em família, e...

- Guest Post: Os Pianos Que A Gente Carrega
Uma adolescente cheia de vida, a Miranda, me mandou um email que merece ser publicado, por causa da fluidez, sinceridade e humor. Ei-lo. Depois de ler dois posts muito bons no teu blog, um piano saiu de cima dos meus ombros. Bom, na verdade, dois pianos,...



Geral








.