Geral
INSULTOS POLITICAMENTE CORRETOS PARA USAR CONTRA AS MULHERES
Na última terça, por ocasião do Dia Nacional de Mobilização dos Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres, perguntei aos meus leitores o que eles faziam para combater a violência. E uma das perguntas que fiz foi se eles já abandonaram termos que condenam a sexualidade feminina (vagaba, vadia, piranha, galinha etc). Um leitor, o Ramon, me escreveu com uma provocação: “Você acabou de esgotar o meu vocabulário. Então qual é o termo ofensivo politicamente correto para se referir a mulheres? E nem venha com o papo de 'você não deve usar termos ofensivos' porque eu não sou perfeito. Eu me estresso, uso termos de baixo calão, cometo erros, desconto minhas frustrações em outras pessoas, grito e, evidentemente, xingo. Portanto, como doutora em Letras, você sabe muito bem que a língua precisa refletir essa realidade e se adequar aos mais diversos usos, o que inclui os ofensivos, naturalmente”. Bom, não sei como ser doutora em Literatura em Língua Inglesa pode me tornar expert em ofender mulheres sem incorrer no politicamente incorreto. Por não usar palavrões (não gosto, nunca usei; o máximo que me permito é escrotossauro, que acho que eu mesma inventei, e que é lúdico, lembra um tipo de dinossauro), sempre me faltou vocabulário pra insultar. Sou uma pessoa bastante calma e que só muito raramente perde a cabeça. Portanto, é difícil eu ter que recorrer a ofensas. Quando eu dirigia (desde que cheguei a Fortaleza ainda não me arrisquei, porque o pessoal parece dirigir ainda pior que em Santa Catarina, e buzina demais), aí sim, muitas vezes ficava com raiva e precisava xingar. O trânsito é obviamente um lugar de estresse (por isso, evite dirigir). Hoje ando pro trabalho, o que reduz drasticamente situações de nervosismo. Eu diria que a maior necessidade que tenho de adotar insultos atualmente é com trolls da internet. Porém, o melhor que se pode fazer é não alimentar os trolls e não lhes direcionar a palavra (mas isso não fará com que eles vão embora).Acho que o Ramon mencionou em algum outro lugar que precisava de vocabulário ofensivo pra se referir à chefa ou à moça que deixa as calcinhas penduradas no banheiro. Pô, que oportunidade você tem de ver calcinhas molhadas senão na sua própria casa? Se isso te incomoda tanto (e não deveria), fale com a pessoa e tente resolver o problema. Quanto à chefa, duvido que você queira termos ofensivos para falar com ela. Imagino que seja pra falar dela, para criar uma espécie de camaradagem com seus outros colegas. Cuidado. Sua chefa pode ouvir, ou esses insultos podem chegar a ela. Lembre-se que violência verbal também é violência. Se você quer viver num mundo de paz, deve também tentar controlar esses ímpetos. Por isso que existem cursos de controle da raiva. Você consegue visualizar um monge tibetano gritando com alguém? Avalie o quanto você realmente precisa perder a calma, e com quem você se enerva com mais frequência. Se de repente você for mais nervosinho com mulheres, aí Houston, we've got a problem. Reflita um pouco, e tente descobrir o que te faz se indignar mais conosco.Mas concordo que às vezes queremos devolver um insulto, e precisamos de vocabulário. Nessas horas é bom tratar de insultar só aquela pessoa, sem ser necessário insultar todas as mulheres, ou os negros, ou os gays. Sugiro qualquer termo que seja unissex. Por exemplo, eu nunca uso expressões exclusivamente ofensivas aos homens, como corno e brocha (que ninguém sabe se é com x ou com ch mesmo). Se não existe piranho, não chame uma mulher de piranha. Aliás, não faça qualquer referência à sexualidade da mulher que você quer insultar, porque nessa instância você sempre estará sendo machista (e isso vai do vagabunda ao mal-amada). Outro dia alguns rapazes no Twitter vieram me dizer que chamar uma mulher de vadia não é machista. É mesmo? É o quê, então? Uma expressão carinhosa? Vamos aceitar a realidade: é machista vigiar e punir a sexualidade feminina, enquanto se celebra a masculina. Ponto. Logo, apague as referências sexuais. Termos referentes à aparência da mulher tampouco são bem vistos, porque vivemos num mundo em que as mulheres têm de ser lindas e jovens sempre, enquanto o homem será valorizado por outras dezenas de qualidades. Novamente, se o termo não tem versão masculina, não o use. Mocreio e barango existem? Não. Então não use mocreia nem baranga. Gorda é muito turma da Mônica pro meu gosto. Lógico, gordo existe, mas num mundo que prioriza a aparência física pra mulheres, ser gorda é muito mais mal recebido que ser gordo. Por sinal, gorda deve ser dos insultos que mais ouço. Mas é de uma preguiça abismal. Ué, dizer que eu sou gorda é uma mera constatação. Eu sei que sou gorda, a diferença é que não acho isso assim tão terrível. Esses dias um mascu me disse que eu deveria procurar uma academia. Eu respondi: “Obrigada pela sua sugestão, mas já estou na academia. Sou doutora, sabe? Opa, não era dessa academia que você estava falando? O quê, você só conhece uma?!”.Burra pode ser uma solução, mas tenho reservas éticas em usar animais como se fossem ofensas. Na realidade, burro e jumento, os animais, são muito mais inteligentes que os trolls. É incrível como usamos nossos animais para insultar outros humanos. Isso diz muito sobre o que pensamos dos animais, e é totalmente injusto. Passa uma visão especista do mundo. Histérica e irracional são termos inadequados, ainda que possam ser usados pra homens. Isso porque essas expressões foram historicamente usadas pra rebaixar a mulher, com o aval da ciência, que sempre é ideológica. A própria origem da palavra já aponta a quem se refere o adjetivo. Hystera é útero em grego. Até o século 17, histeria estava associado apenas a distúrbios no útero. Inclusive, um indicativo de uma sociedade misógina é que fases comuns a tantas mulheres sejam vilipendiadas. “Você está de TPM”, “sua velha!”, “você está na menopausa” são utilizados para insultar. Mas pense bem: deveriam? Mesmo com todas essas restrições, ainda sobra muita coisa. Chame uma mulher do mesmo que você chamaria um homem se você quer ofender: babaca, ridícula, maldita, cretina, idiota, imbecil (algumas pessoas consideram essas três últimas palavras capacitistas, tanto quanto retardada). Ah, aproveite e risque do seu vocabulário termos como doentes mentais, retardado, mongol, autista etc. Isso não por respeito às mulheres, mas pelas pessoas que têm problemas mentais de verdade e não merecem ter suas dificuldades usadas como insulto. Linguagem é algo que se adquire. Temos o poder de moldá-la aos nossos tempos. Ninguém disse que ser politicamente correto seria fácil, mas é possível. Pra mim é um aprendizado constante.
-
Pessoas Que VocÊ Vai Conhecer Em DiscussÕes Sobre Sexismo
Algumas leitoras me enviaram um post muito interessante tirado daqui, que tomei a liberdade de traduzir (e já falei que não sou muito boa nisso, e toda vez que falo alguém diz “Ohhh, mas você não é doutora em Inglês?”, e eu explico que em Literatura...
-
Luana, ViolÊncia, E Mulheres Barbudas
Atire a primeira pedra quem nunca foi chamada de vadia. Esses dias fiquei sabendo muito mais do que queria sobre a vida da Luana Piovani. Quer dizer, eu sei que o seu ex, Dado Dolabella, agrediu Luana e sua assistente. Sei que há camisetas circulando...
-
Blogueiras E Trolls
Tá, isso é antigo na blogosfera americana, aconteceu no ano passado, mas o que posso fazer se sou lerdinha e só fiquei sabendo agora? Tenho que contar. Observe bem essa foto. É de uma reunião que o ex-presidente Clinton teve com um grupo de blogueiros...
-
Hip Hop, Preconceito E Identidade
Vi um documentário muito interessante sobre hip hop ano passado. Foi num auditório da universidade, e infelizmente depois não houve espaco pra trocar impressoes. Outra infelicidade é que não anotei o nome deste documentário independente, de distribuição...
-
Quando você é homem e diz que não quer namorar, que gosta da sua liberdade, quer ter tempo pra fazer suas coisas sozinho, ninguém acha que você está mentindo. Eu não sou homem, nunca fui homem, eu tô falando do que eu vejo. Ninguém, quando um...
Geral