MOMENTOS DE TENSÃO NUMA PALESTRA
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MOMENTOS DE TENSÃO NUMA PALESTRA



Pelo pouco que estou acompanhando, estão rolando umas fofoquinhas desagradáveis. Permitam-me situar vocês, com a minha sinceridade habitual.
Estive em SP sexta e sábado para participar de dois eventos (não deu tempo de entrar na piscina do hotel, de novo). O primeiro foi a mesa Censura e Humor, organizada pelo Núcleo de Pesquisa em Comunicação e Censura da ECA-USP. Foi ótimo! As opiniões na mesa eram divergentes, mas o debate com o prof. Elias, uma referência no assunto, e com o charmoso palhaço Hugo, sob a coordenação do Walter, uma simpatia, foi muito bom. E não sei o que eu falei no final da minha palestra que fez algumas lindas espectadoras chorarem. Fui muito tietada (agradeço, agradeço!), e a repórter da TV Brasil que me entrevistou pouco depois até se surpreendeu com o número de fãs. 
Isso que ela não viu uma senhora que interrompeu um papo meu com uma leitora querida para me dar seu cartãozinho dizendo que estava disposta a ajudar, de graça, pra que eu melhorasse minha apresentação... a começar pelo meu cabelo. E pos as duas mãozonas nos meus cachos, querendo alisá-los. Doutora da USP, gente! Mas não vou reclamar, porque realmente adorei ter participado do evento, e ninguém soube explicar o que ela estava fazendo lá.
No dia seguinte, sábado, estive em outra mesa, esta sobre Olhares Feministas. Não tinha nada a ver com a organização anterior, apenas que a Marcha das Vadias SP aproveitou que eu estaria na cidade e me convidou para o evento. Foi na Fundação Rosa Luxemburg, uma casa divina em Pinheiros. Eu falei sobre a mulher na propaganda, e a professora Heloísa, da Antropologia da USP, sobre gênero e mídia, principalmente novelas. Gostei muito dela, um amor! As perguntas também foram incríveis. É sempre lindo ver um auditório cheio de jovens militantes, todas entusiasmadas, idealistas, com grande vontade de mudar o mundo.
Uma das perguntas foi da Mariana, e ela estava brava (um sentimento totalmente válido). Ela quis saber nossa opinião sobre homens feministas e sobre mulheres de direita que se apropriam do discurso feminista para aparecer na mídia. Respondi que eu gosto de homens feministas e que, apesar da injustiça que é que eles muitas vezes sejam mais bem vistos que mulheres feministas (afinal, eles não são chamados de mal-amados histéricos), eles devem fazer parte de movimentos feministas, embora não em posição de liderança (porque seria tão estranho como eu, hétero, ser líder num movimento LGBT. O tweet em inglês que vi ontem e traduzi é bem pertinente: homens que querem ser feministas não precisam de espaço no feminismo; precisam pegar o espaço que têm na sociedade e torná-lo feminista).
Acho que eu já havia respondido outra pergunta dizendo que detestava briguinhas entre feministas, competições de quem era mais feminista, gente reclamando de “tive minha carteirinha feminista confiscada” (como se alguma feminista tivesse poder ou interesse em distribuir ou tirar “carteirinhas”), que as discordâncias nunca eram críticas construtivas, apenas fofocas vazias nas redes sociais, e que precisávamos aprender a discordar, já que nunca concordaremos em tudo, mas que querer desqualificar feminista que pensa diferente é imaturo. Algo assim.
Eu sou meio devagar, principalmente pela manhã, mas senti que parte da fala da Mariana estava direcionada ao Femen e, mais particularmente, a Sara Winter, representante-mor do Femen Brazil. Ela estava na plateia. Quando cheguei à Fundação Rosa Luxemburg, foi uma das primeiras pessoas que vi, inconfudível com sua guirlanda de flores nos cabelos loiros. E assim que a vi, pensei: ish, se alguém perguntar sobre o Femen, o quê que eu faço? Quero dizer, minha opinião sobre o Femen (assim como sobre qualquer coisa) é pública e conhecida, mas é muito desconfortável expor alguém -– a Sara, no caso –- no meio de uma palestra.
Eu não tenho grande interesse em expor ou criticar indivíduos. Quero criticar ideias, atitudes, comportamentos. Acho que um dos problemas do feminismo é justamente individualizar demais. É aquele negócio: ah, porque tem meia dúzia de prostitutas que gostam do que fazem, vamos esquecer as milhões de prostitutas que são traficadas, e vamos parar de criticar a prostituição. Eu não quero criticar prostitutas, mas quero poder criticar a prostituição. De preferência sem ser tachada de moralista, recalcada, sex-negative.
Só que, pra responder à pergunta da Mariana, eu tive que falar do Femen. Disse que o Femen perdeu a credibilidade, não só no Brasil como também na Ucrânia. Que o movimento não representa o feminismo, não tem propostas, só quer aparecer na mídia. Mas que também não é culpa do Femen que a mídia as pinte como únicas feministas. E que eu já estou falando pra todos os carinhas que me dizem coisas como “Se todas as feministas fossem como as do Femen, o mundo seria mais bonito”, com esta imagem retirada de uma das páginas (reais!) do Femen:
Pois é, amigo, viva bem sem suas bolas. Eu, uma feminazi ogra, nunca quis cortá-las. Gosto delas. Não tenho muito apreço pelo patriarcado, nem pelo modelo de masculinidade vigente, mas homens são legais.
Bom, depois do final da mesa, e depois de um montão de gente me abraçar e trocar ideias, Sara veio falar comigo. Várias pessoas que estavam por perto, como a Elisa, a Mara, a Ceci, e a Amanda, uma das organizadoras do evento, participaram do bate-papo não planejado. Foi um pouco tenso, mas produtivo, na minha opinião. 
Eu disse pra Sara que, pra um movimento puramente midiático como o Femen, ele tem imensas falhas de comunicação. Não consegue deixar claras suas propostas, e é incapaz de responder rapidamente aos muitos questionamentos que recebe. E que se queimou demais com os últimos acontecimentos (o falso sequestro de Bruna e sua saída, por exemplo). 
E que, pra mim, não foi apenas o Femen Br que se queimou, mas o Femen de maneira geral, ponto. E que, se antes eu tinha dúvidas sobre a eficácia dos protestos do Femen, agora não tenho mais. E que não me agradava que ela falasse que o feminismo no Brasil é elitista, acadêmico, e não acessível. E que, se ela se considera incompreendida, deveria responder ponto a ponto às colocações do dossiê anti-Femen (que foi tirado de onde se encontrava, mas ainda está aqui). Essa minha sugestão foi posteriormente transcrita por alguém falando no meu nome como se eu tivesse dito a Sara para escrever sua biografia (wtf?).
Sara concordou com algumas críticas e contou que o Femen Br estava dando um tempo para poder se preparar melhor, que ela estava lendo muito e procurando aprender, vindo a palestras como essa, mesmo que ninguém quisesse que ela estivesse ali. Disse também que as pessoas não perdoam os erros do passado dela, e que recebe ameaças de morte.
Quando perguntada sobre o que é neofeminista (que é como o Femen se autointitula), Sara não soube, ou não quis, responder. Ela disse que é porque é um feminismo diferente, mas não soube explicar diferente do quê. As meninas pontuaram que uma classificação dessas põe o Femen em oposição às outras feministas, mas Sara argumentou que “elas” (as Femen ucranianas, pelo que entendi) levaram quatro anos pensando no termo, e que não iam mudá-lo agora.
Muito mais coisa foi dita, mas não vou me lembrar de tudo. No final, me despedi da Sara, disse que não somos inimigas e nem opositoras. Abracei todo mundo e saí (fui levada pra almoçar pelas hiper gentis Mara e Ceci), porque precisava pegar meu voo de volta pra Fortaleza pouco depois.
As fofoquinhas que fiquei sabendo no dia seguinte é que eu havia adotado uma atitude maternalista e condescendente com a Sara, e que cometi o crime de conversar com ela. Ah, pelamor, né? Imagina se vou me negar a conversar com alguém! Desculpe decepcionar, mas não participo de linchamentos. Não tenho instinto maternal, mas sinto muita pena da Sara, sim. Ela me parece estar completamente sozinha, mesmo quando está na companhia de pessoas que não deveriam ser de sua confiança (não posso explicar essa frase enigmática, porque é um bafão que não tem nada a ver comigo, e não quero me meter). Sara é, como sabemos, despreparada para falar sobre feminismo, e isso fica ainda mais evidente quando está na companhia de jovens como ela, mas com um histórico de ativismo e de ideais da esquerda, o que faz toda a diferença. Porém, acredito que ela esteja se esforçando para aprender. Sua entrevista no Jô, apesar da babaquice do apresentador, já foi uma melhora.
Sara foi jogada, ou se jogou sozinha, não importa, aos leões. Mas ela é uma menina de 21 anos. Pra mim, a responsabilidade é do Femen Ucrânia, que permitiu que isso acontecesse –- que permitiu que uma moça que até pouco tempo atrás desmerecia a Marcha das Vadias por algumas tirarem a roupa em público, e que se declarava da direita nacionalista, e que tem um símbolo nazista tatuado, começasse um Femen Brazil (com z). Eu vou criticar o Femen quando julgar necessário, mas não tenho vontade de criticar uma só pessoa, a Sara.
Pra mim, um grupo que abre franquias em outros países sem minimamente preparar suas ativistas não é sério. Não dá pra colocar em sua página uma mulher com uma foice numa mão e testículos cortados em outra e querer ser levado a sério. Isso sem nem entrar no mérito de quem patrocina o Femen Ucrânia. Mas Sara não é inventora de nada disso.
Minha sugestão pra Sara é que ela se afaste do Femen, faça uma faculdade pública em História ou Ciências Políticas, entre nos movimentos estudantis, participe dos movimentos feministas, onde desejo que ela seja bem acolhida, leia tudo que puder, expurgue os fantasmas do seu passado, rodeie-se de pessoas que a amam. E, se depois de quatro ou cinco anos ela, com mais maturidade e conhecimento, ainda queira fazer parte do Femen, que faça, se o Femen ainda existir.
Não creio que minha sugestão será aceita. Mas não desejo nada de mal nem a Sara, nem a nenhuma feminista ou neofeminista, seja lá o que for isso. O feminismo já existia e vai continuar existindo apesar das presepadas de um grupo.




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