UM FILME ANTIGO E MINHA EXPERIÊNCIA DE BULLIED
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UM FILME ANTIGO E MINHA EXPERIÊNCIA DE BULLIED


Cuidado com meu Guarda-Costas (1980) não é nenhuma obra-prima, mas se a gente for pensar em Meu Nome é Taylor, Drillbit Taylor, Cuidado é mais ou menos assim: comparar isso com a Mona Lisa (com todo respeito ao maridão). Pra começar, Cuidado não é uma comédia, e sim um drama sobre um rapaz que é bullied no colégio por um Matt Dillon muito jovem, e tem que pedir ajuda a um colega grandão e com má reputação (feito por um Adam Baldwin muito jovem) para defendê-lo. Eu revi o drama esses dias, e fiquei pasma em ver a Joan Cusack (de aparelho) e a Jennifer Beals, que três anos depois ficaria famosa mundialmente por Flashdance, mais tarde sumiria da face da Terra, e ainda renasceria das cinzas no seriado The L Word. Ela não tá nem creditada em Cuidado, e não tem nenhuma fala, mas não dá pra não reconhecê-la como uma das alunas legais (ao contrário dos bullies). Agora, continuo sem entender como uns valentões podem abusar de uma vítima na frente de todo mundo e ninguém fala: “Pare imediatamente, seu idiota!”. Quer dizer, nem uma das meninas tem voz? Que eu me lembre, o único filme que lida com bullies em que uma menina se intromete é o ótimo Bem-Vindo à Casa de Bonecas (vou publicar um texto sobre ele amanhã).
Eu fico tentando me lembrar da minha infância. Não havia bullies na minha escola, então não posso saber como eu reagiria. Mas eu tinha uma turminha no meu prédio, e uma das minhas amigas nessa turma era a Regina. Ela era um doce, filha do zelador, e jogava bem futebol. Só que também era gordinha e, aos doze ou treze anos, ainda não tinha entrado na puberdade. Tava naquela fase em que, se você não fala nada, as pessoas podem demorar pra descobrir se você é menino ou menina. Na minha turma isso não era um problema, mas ocasionalmente, quando brincávamos com crianças de fora, alguns garotos eram bem estúpidos com ela (porque crianças podem ser cruéis). Eu não tinha nenhuma tolerância com essa gente, mandava parar na hora, e explicava direitinho que, se quisessem brincar com a gente, tinham que tratar bem todo mundo. Acho que eu era meio mandona, eu sei, mas por uma boa causa. E o pessoal obedecia. Por isso não entendo quando vejo uma humilhação pública num filme, e todas as garotas ficam olhando sem interferir, como se fossem zumbis. Se uma delas se intrometer, os valentões vão fazer o quê? Bater nela? Pode até acontecer, mas suponho que rapazes batendo numa menina chamariam a atenção da diretoria da escola.
Pra não dizer que eu nunca fui bullied, vou recordar uma ocasião, com muito esforço, porque que eu me lembre foi uma vez só. Eu tinha uns oito anos e morava no Rio. Acho que a professora havia pedido pra cada aluno trazer alguma coisa de casa pra montar uma exposição. Não tenho a menor idéia do tema da exposição, só que acabei levando uma estatueta de madeira de um homem nu, que vivia na sala de casa. Quando eu digo “homem nu”, não estou me referindo ao Davi de Michelangelo. Não havia órgãos genitais naquela estatueta tosca, sem cor. Era nu como o Ken da Barbie, sabe? Mas uns coleguinhas da minha classe devem ter achado aquela estatueta a coisa mais indecente já vista, porque a pegaram e simularam atos sexuais com ela. Claro que os insultos não se restringiram à ela e eu também fui xingada. Mas o que me chateou mais foi o desrespeito com a estátua. Eu me senti a própria. Porque aquele troço vinha da minha casa, tava todo dia na sala, e era algo familiar, íntimo. E eu não compreendia como alguém podia ver maldade num nu, ainda mais num nu que nem era nu. Esse foi meu momento “vítima de bully, e doeu. Seguiu uma das principais características do ritual bullístico: ninguém interferiu pra me acudir. Nessas horas os adultos nunca aparecem, e as vítimas-mirins são deixadas às moscas. Àquelas do Senhor das Moscas, bem entendido.




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