UM LOUCO ENSINA A SE APOSENTAR CEDO
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UM LOUCO ENSINA A SE APOSENTAR CEDO


No final de 2008, descobri um blog americano que me serviu de inspiração por um tempinho. Inspiração para poupar dinheiro, bem entendido. O blog é pra quem quer se aposentar jovem, ou seja, bem antes dos 60 ou 70 anos com que as pessoas normalmente se aposentam (se é que conseguem fazer isso). É criação de Jacob, um dinamarquês de seus trinta e poucos anos que vive na Califórnia (não é esse da imagem!). Jacob tem doutorado, mas já parou de trabalhar. Agora só trabalha como free lance, e só pra fazer o que realmente quer. É o que se chama de ser financeiramente independente, não depender de trabalho pra viver. Seu segredo não é ter ficado rico. Certo, ele guardou uma boa grana (mais de 80% do que ganhava por mês) durante os anos em que foi assalariado. Mas a possibilidade de se aposentar tão cedo é mesmo ele gastar tão pouco. Jacob gasta menos de 7 mil dólares por ano para todas as suas despesas. Isso dá 580 dólares por mês (esqueça que é dólares e pense em reais, porque é quase a mesma coisa. O que vale um dólar lá geralmente vale um real aqui). Como que ele faz? Ele não tem carro, anda de bicicleta apenas, nunca come fora, aliás, só faz uma refeição por dia, mora num trailer, nunca vai ao cinema nem nada. Ele é casado, mas calcula seus gastos separados dos da esposa (que não é tão miserável quanto ele).
Eu gostei mesmo de um dos seus lemas, “Pare de gastar dinheiro”. No fundo, no fundo, a gente só precisa gastar pra comer e pra ter um teto pra dormir. Suas dicas são pra jogar fora a TV, porque só isso já te dá quatro horas a mais por dia. É verdade. Mas eu tenho usado cada vez menos tempo pra ver TV e cada vez mais pro computador. E nem pensar que vou jogar o meu laptop fora. Com esse tempo extra, aprenda a fazer as coisas. Arrumar o seu próprio telhado, ou desentupir seu banheiro. E ele faz a provocante pergunta: quantos banheiros a gente realmente precisa? Pois é, faz dezesseis anos que eu e o maridão vivemos com um. Às vezes o segundo faz falta. Lá em Detroit era um também e, como muitas vezes saímos de casa no mesmo horário, um tinha que acordar antes do outro pra tomar banho. Mas não é algo de vida ou morte. As casas que a gente tá começando a ver em Fortaleza tem três suítes, o que soa beeem desnecessário.
Outra coisa, que eu estou cada vez mais radical a respeito, é ter o mínimo possível de coisas. Quantos pares de sapatos eu preciso? Dois dá, e mais um par de chinelos? Quantas blusas e calças? Quantos sutiãs? Pra calcinhas, sete já não seriam suficientes – uma pra cada dia? Tá, oito, se a gente ficou com preguiça de lavar roupa naquela semana? A gente acumula muita coisa inútil. Não dá pra falar com o maridão sobre isso, porque ele fica histérico. Sério, histérico mesmo. Tem um termo pra isso em inglês, anal retentive. É parecido com o nosso bolo fecal isso de ter medo de jogar coisas fora. Agora tô lembrando de um diálogo entre o Woody Allen e a Diane Keaton em Noivo Nervoso, Noiva Neurótica. O Woody diz: “Não posso ver um filme que já começou porque sou anal”. E ela: “Esse é um termo educado pra descrever o que você é”.
Meu problema é com os livros. Tenho muitos, e desses eu raramente me desprendo. Nisso a regra do “se você não usou tal coisa por mais de dois anos, livre-se dela” não funciona. Mas o problema é que não tenho bibliotecas boas por perto. A maior parte dos meus livros é em inglês, e eu moro no Brasil. Quando (se?) todos os livros estiverem disponíveis na internet e bolarem um jeito legal de ler textos da internet sem a tela do computador, ter todos esses livros não será essencial.
Mas realmente, é necessário ter tanto que a gente tem? Chega uma hora em que pagamos pra simplesmente manter o padrão que temos, e esse padrão nem é tão alto assim. É preciso sacrifícios. Se ter um home theater é importante pra você, você terá que seguir trabalhando pra comprar e manter esse equipamento. Porque não é só o home theater em si, é o gasto a mais com eletricidade, a manutenção dos aparelhos... Eu não poderia ter um na minha casa. Nossa TV de 29 polegadas já é meio grande demais pro quarto. Precisaríamos ter uma casa maior pra ter uma TV maior.
Mas, voltando ao Jacob, ele comprou uma espécie de trailer, um mini-ônibus com cozinha, banheiro e quarto. Nos EUA é possível viver num desses, e muitos aposentados velhinhos e conservadores fazem isso, só que com trailers mais caros e luxuosos. O maior problema é onde estacionar, e eles geralmente param no Wal-Mart. Vi um documentário inteiro sobre isso ― muito chato, por sinal. Mas, enfim, o que o casal jovem quer é diferente. Primeiro que eles não pretendem viajar, e sim deixar o trailer estacionado. É pra não gastar em aluguel, que na Califórnia custa uns 1,400 por mês. No Brasil seria impossível viver assim, num tailer. Não apenas as estradas são ruins, como assaltos seriam um problema. Lá nos States não há esses dois percalços.
E vale frisar que Jacob é louco. Por exemplo, ele come apenas uma refeição por dia (sem variar o cardápio), o que não é aconselhável de jeito nenhum. Ele reutiliza desodorante usado. Ele é obcecado pela forma física. Ele é homem, e em vários posts já provou que não consegue ver além do seu privilégio masculino. Essas coisas. Mas, em outros sentidos, nesses de gastar pouco, eu me sinto praticamente sua alma gêmea. Tenho que concordar com ele: “Liberdade financeira é a maior forma de liberdade numa sociedade capitalista”.
A ideia é buscar alternativas de como se viver. Porque pra viver do jeito tradicional é fácil: é só seguir imitando os outros. Este post do Jacob é ótimo. Fala sobre como é viver nos EUA (e no Brasil, pra classe média), e como ninguém precisa trabalhar pra pagar uma dívida a vida toda.
Pra muita gente, trabalho é uma maneira de manter a sanidade mental. É não ter que se preocupar com o que fazer com tanto tempo livre. Como o protagonista de Um Grande Garoto sente que precisa fazer pra ocupar o seu tempo. O trabalho compulsório pode nos impedir de pensar no que realmente queremos da vida.




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