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UM POUCO MAIS SOBRE O CASO DO PROFESSOR
Espero que este seja o último texto que escrevo sobre o professor de esquerda que manda selfie de pinto. O último por bastante tempo, pelo menos. Até porque vou viajar no sábado pra lugares maravilhosos sem conexão boa pra internet.
Mas por que escrever sobre isso de novo, pela terceira vez? Bom, porque as informações não param de chegar. Porque continua tendo muita gente só falando nisso. Porque as vítimas (as garotas que fizeram as denúncias, aquelas garotas que um montão de pessoas trata como culpadas) seguem sendo perseguidas e ameaçadas. O incrível é que o discurso geral é sempre "Denuncie!"
Aí, quando a pessoa denuncia, vem uma multidão julgá-la e condená-la. Fica difícil convencer mulheres a denunciarem as violências contra elas quando 1) legalistas vem correndo dizer que a denúncia só pode ser feita pra uma justiça que tarda e falha; e 2) elas são tratadas desse jeito.
E elas não são vítimas passivas. Foram elas que se organizaram e decidiram fazer um Tumblr. Aliás, concordo muito com este comentário que foi deixado ontem aqui: você se sentir vítima não te faz uma pessoa fraca ou incapaz. Eu acrescento: nem quer dizer que você esteja 100% certa. Mas que deve ser escutada.
Ontem saiu numa coluna do Globo e na Folha algumas poucas linhas sobre o caso.
O professor foi contatado por jornalistas, disse que não iria se manifestar, e os direcionou a sua advogada, que afirmou que as conversas eram consensuais. Reparem que ela não negou que as conversas existiram, nem que foram forjadas ou editadas (acusação de muitos dos defensores do professor), apenas que eram consensuais. Anteontem o Tumblr publicou mais dois relatos. Um falava de uma estudante de 17 anos que, alguns anos atrás, foi a um motel com o professor. Chegando lá, pouco depois das preliminares, o professor passou a chamá-la de puta e piranha. Ela travou, ficou chocada, porque a persona que ele cultivava em público não correspondia àquela figura no motel. Ele então a chamou de moralista, a xingou um pouco mais, a deixou num ponto de ônibus, e foi embora de táxi pro seu hotel. Aquilo a marcou: ela tinha decepcionado um intelectual tão genial! Pros amigões do peito do professor, esse relato foi uma prova incontestável da sua inocência:
Afinal, ele não estuprou! Estão vendo como ele é boa gente? Para outros bróders, se ele tivesse estuprado, a moça teria contribuído "com seu comportamento para a prática do estupro naquele momento". Quem mandou ir pro motel com o cara?
Outros amigos do prof acharam o relato apenas ridículo, porque onde já se viu uma mina mudar de ideia já dentro do motel? E ainda ficar mal por ser xingada por um sujeito quase 30 anos mais velho que ela via como modelo?
As meninas do Tumbrl retiraram o relato depois, a pedido da autora.
Uma pena, mas muita gente está temerosa. Quase todo mundo só quer falar como anônimo. Foi o caso de dois comentários deixados no blog:
Dois dias atrás recebi um email de uma ex-aluna dele, que não quer ser identificada, com medo de represálias. Reproduzo algumas partes:
"Comigo ele foi absolutamente prepotente, arrogante, autoritário. Ele não me assediou, mas assediava uma amiga. Basicamente, em troca de encontros noturnos e jantares, ele a orientava com o trabalho.
O fato é que, em Nova Orleans, e na Tulane, ninguém gosta dele. As mulheres, todas têm pavor. A comunidade brasileira de lá, que é pequena, não mantém relações com ele, pq a fama de cafajeste se concretiza a cada episódio. Uma amiga disse que ele a beijou à força, sem mais nem menos. Isso anos atrás.
Soube também que ele tem um processo por assédio sexual nos EUA. Mas é um processo administrativo, e é por isso que ele, tão fodão, nunca conseguiu ir para nenhuma universidade mais conceituada como Harvard ou Columbia, já que a ficha dele é suja. E que ele foi demitido de outra universidade por ter tido um caso com uma aluna.
Importante dizer que me parece que ele assume esse tipo de atitude apenas com brasileiras (talvez latinas em geral). Talvez por sermos mais "calientes". Ou talvez mais "dóceis". Mas creio que é porque uma cidadã americana o denunciaria, e a prisão seria imediata, bem como o processo seria certo. Você vai preso, para depois tentar provar que não é culpado. Nesse caso, duvido que ele saísse ileso.
Estou imensamente feliz que essa história toda esteja vindo à tona. Não por vingança por ele efetivamente ter me tratado mal e tentado me prejudicar gratuitamente.
Mas porque ele é um predador, que precisa parar.
Parabéns pela coragem, e, por favor, mande meu abraço e minha admiração para as vítimas. Vai dar tudo certo."
E hoje cedo recebi este email de Alex Castro, de quem várias radfems (feministas radicais) não gostam. Pra ele, teria sido muito mais cômodo ficar calado. Quem quiser se comunicar com ele, que está longe das redes sociais há mais de um ano, pode escrever para alexcastro.com.br/contato. Porém, emenda ele, "Tenham em mente que já escrevi esse texto com muita cautela e cuidado. o que eu podia escrever eu já escrevi." Segue o email do Alex:
"meu nome é alex castro e, por seis anos, fui estudante de pós-graduação do departamento de espanhol e português da universidade de tulane, em nova orleans, como orientando do professor idelber avelar.
pelos últimos dias, tem acontecido uma discussão sobre a conduta sexual do idelber na internet.
mas a maioria das pessoas no brasil apenas conhece o idelber dos blogs e, pessoalmente, em poucas botecadas e palestras ocasionais. já as pessoas nos estados unidos, via de regra, só conhecem o idelber professor e orientador, muito poderoso, capaz de fazer e desfazer carreiras. são dois mundos que pouco se comunicam.
como ex-aluno de tulane, decidi escrever esse texto para revelar que esses episódios que estão surgindo não são casos isolados, nem aconteceram no vácuo, e só confirmam a fama dele em nossa universidade.
infelizmente, não posso citar aqui as mulheres próximas a mim, acadêmicas, colegas, mestrandas, doutorandas, que relataram muitos episódios de assédio moral e sexual, pois estaria violando a privacidade delas. uma delas me pediu explicitamente que não falasse do seu caso nem de forma anônima. (posso afirmar que mais de uma abriu processo administrativo contra ele.)
falando da minha experiência, nunca me considerei amigo do idelber, mas eu o admirava muito (como tantas pessoas) e fui fazer mestrado e doutorado em tulane a convite dele em 2005.
seis anos depois, em 2011, em grande parte pelo assédio moral que sofri, mas não só por isso, larguei o doutorado, voltei para o brasil sem diploma e, desde bem antes disso, eu já pouco falava dele.
minha mensagem para todas as pessoas que estão defendendo o idelber é que o problema vai muito além de printscreens de conversas na internet.
essas mulheres fazendo denúncias não estão loucas, não estão inventando, não estão exagerando, não estão vendo coisas.
e, mais importante, não estão sozinhas.
o que aconteceu com elas é parte de um padrão que já acontece há muitos anos, e que vem sendo silenciado, relevado, e perdoado por pessoas que ou admiravam, ou temiam, ou precisavam do idelber.
hoje, felizmente, ganho a vida como escritor independente e não tenho rabo preso: não sou contratado por ninguém, não tenho vínculo com nenhuma empresa, organização, instituição. então, se esse tipo de liberdade, que construí a muito custo, não serve pra lutar contra a violência e para apoiar as vítimas, então serve para quê?"
Acho essa pergunta do Alex extremamente relevante.
Faz poucos dias Silvio, meu marido, me fez uma pergunta: o que você quer? Ele estava se referindo a trazer tudo isso a público. É sempre difícil responder. Primeiro, eu quero ouvir, acolher, apoiar, quem se considera vítima neste caso. Não tenho o menor interesse em patrulhar fetiches ou impor qualquer coisa. Deve ter um montão de gente que adora trocar mensagens eróticas. Este caso não é sobre vocês.
Segundo, eu quero que assédios baseados em relações de poder parem. Again, se vocês adoram BDSM, este caso não é sobre vocês. Mas tá cheio de mulher que é assediada por professores, e não gostam. Uma das perguntas que mais ouço nas palestras que dou sobre machismo na universidade é justamente "O que podemos fazer contra isso?" Eu recomendo falar com o professor e, se isso não resolver, procurar o coletivo feminista da universidade, que levará o caso ao departamento. Eu não quero que professores sejam demitidos. Mas quero que não abusem de sua posição de poder. Acho o fim um cara se fingir de feminista em público e, em emails privados, xingar feministas, dizer que são feias e mal-amadas, ao mesmo tempo em que lista as feministas que já "comeu" (algumas das quais ele sequer conheceu pessoalmente).
Eu só gostaria de viver num mundo mais feminista e menos hipócrita mesmo. UPDATE: O professor reapareceu hoje (4/12) para se defender, negar qualquer infração, avisar que vai processar geral, e chamar feministas de inquisidoras moralistas macarthistas stalinistas. Ah, e sugerir que houve perseguição política. Leia aqui.
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