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CRÍTICA: ESCURIDÃO / Faça como as ovelhas: pule
Era optar entre um terror desconhecido e um terror conhecido. Ou seja, entre “Escuridão” e a 45a comédia do Didi. Escolhi o terror desconhecido porque eu até gostava dos Trapalhões, mas quando eu tinha oito anos. Pois, “Escuridão” é sobre a Maria Bello (que corre o risco de ser indicada ao Oscar por “Marcas da Violência”) indo parar no país de Gales com sua filha, uma menina problemática. Lá só tem o pai, o Sean Bean (vilão de “A Ilha” e “Plano de Vôo”), um caseiro, e ovelhas. Muitas ovelhas. Li inclusive que o livro que originou esta adaptação chama-se “Sheep”. Logo logo a garotinha estará brincando à beira de um abismo que dá prum mar revolto e cheio de pedras. Isso quando não estará vasculhando seu lugar favorito na casa – um ex-abatedouro, claro. Onde mais? Criança em filme de terror não é chegada a um inocente escorregador. A menos que o escorregador dê num mar revolto. Ah sim, outro fato acontece: a filhinha some. Mas tudo bem, porque aparece outra bem parecida. O único porém é que essa morreu há mais de meio século, e que seu pai malévolo costumava distrair-se com uma técnica chamada trepanação (não é o que você está pensando).
Bom, quando a gente começa a conversar com gurias que se foram desta pra melhor há um tempão, está na hora de se internar num spa. Mas a Maria Bello tem programa mais atraente, e fica lá descascando as paredes do abatedouro. Pra falar a verdade, quase dois terços de “Escurinho” dedica-se a alguém procurando alguém. E dá-lhe “Sarah? Sarah?”, “Adelle? Adelle?”, “Mãe? Mãe?”, e “Ebril? Ebril?”. Só faltou ovelhinha gritando “Bée? Bée?”. E por falar nas ovelhinhas, a cena mais legal é quando um rebanho inteiro comete suicídio coletivo, pulando do penhasco. E é totalmente compreensível. Afinal, se eu fosse uma ovelha obrigada a dividir a ilha com a garotinha insuportável, eu também pularia. Outra cena divertida ocorre quando fecham a porta bem no nariz da Maria. Não sei se era pra ser comovente, mas o público riu que se acabava.
Não vou dizer que “Escurinho” não assusta, porque assusta sim. A cada dez minutos, por aí, os produtores inserem algum quadro abrupto que não tem absolutamente nada a ver com a cena anterior ou subseqüente, e enchem esse quadro de barulho. Aí a gente faz que nem as ovelhinhas e pula, ué. Normal. Isso me lembrou de um cinema em Búzios onde eu costumava ir quando criança. Nas sessões de horror, o dono da sala se escondia e, nos momentos que deveriam ser apavorantes, ele batia com tudo numa panela. A gente literalmente pulava. Este cinema do panelaço tá cada vez mais em voga hoje em dia. Susto maior que um gongo só quando, no meio da sessão, alguma coisa esbarra na sua perna, em seguida você vê uma ratazana andando pelo corredor e, quando vai gritar, percebe que os qui-qui-quis dos ratos abafaram o som do filme (isso aconteceu em SP). Mas sabe, muito mais difícil que armar o cinema do panelaço é criar um clima de suspense contínuo, como acontece em “O Iluminado” e “O Bebê de Rosemary”, por exemplo.
Voltando à “Escurinho”, chega uma hora em que a menina de 60 anos pede pro Sean Feijão ser o pai dela. Ele recusa educadamente, dizendo que já tem uma filha. Eu esperava que a garota diabólica risse e dissesse algo como “Não tem mais, seu mané”. E é uma fofura que nossos entes queridos e bichinhos de estimação voltem do além, mas, como a gente aprendeu com “Cemitério Maldito”, eles não voltam do mesmo jeito. Parece que a morte faz alguma coisa estranha com uma pessoa. Eu também esperava que a menininha problemática número um falasse pra número dois, “Sai branca azeda, que este corpo não te pertence!”. Mas como isso não ocorria, imitei o slogan do filme (“Até onde você iria pra salvar a vida de quem ama? Iria ao encontro da própria morte?”) e perguntei pro maridão se ele pularia de um penhasco pra me salvar. A resposta dele: “Sei não, a água parecia gelada”.
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