"NÃO QUERO ME SEPARAR, MAS NÃO SUPORTO O MACHISMO DO MEU MARIDO"
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"NÃO QUERO ME SEPARAR, MAS NÃO SUPORTO O MACHISMO DO MEU MARIDO"


A C. me enviou este relato:

Desculpe-me pela intimidade, mas te acompanho há tanto tempo que sinto que você é minha amiga. Te escrevo pra pedir um conselho sobre algo que vem me incomodando no meu casamento. 
Meu pai amado segura uma
Lola bebê
Antes de começar minha história gostaria de falar um pouco sobre como cresci, só pra contextualizar: meu pai, assim como o seu, é o melhor pai do mundo, um homem sábio, devotado, ótimo marido. E veja bem, meu pai é militar, e foi militar na época da ditadura, mas ainda assim pense numa pessoa sem preconceitos e a favor da liberdade pessoal de cada um, incluindo aí suas filhas e seu filho. Dito isso, me casei muito cedo, tive uma linda filha, esse relacionamento não deu certo, e há quatro anos me casei novamente.
E é aí onde começa o meu dilema. Meu marido também e militar e, até onde eu achava, uma pessoa sem preconceitos. Porém, Lola, acho que me enganei. Quando vieram a público os casos de estupro nas faculdades de São Paulo, assistindo ao jornal começamos o debates sobre a questão da falta de apoio às vítimas e a falta de punição dos culpados. Teria sido um debate normal, se não fosse a seguinte frase: se fosse minha filha, eu diria para ela não ir a esse tipo de festa, pois é isso que vai se encontrar lá. 
Ora, eu estudo em uma universidade federal, e perguntei: e se fosse eu? E a resposta foi que eu não bebo e não ando de roupa curta, então a probabilidade de isso acontecer comigo era quase zero. E se mesmo assim eu for estuprada, a culpa vai ser minha? Ou eu estou previamente desculpada, por não fazer nada de "errado"? E se for minha filha, a culpa vai ser dela? As mulheres não têm direito de se divertir, sem estar o tempo todo acompanhada de alguém que zele por sua vida? Quer dizer que só porque as mulheres bebem e usam roupa curta elas merecem ser estupradas? 
A resposta pra última pergunta foi que merecer não merecem, mas estavam procurando problema, então que arquem com as consequências.
A questão, Lola, é que passei a notar diversas outras atitudes no meu marido, que antes para mim eram absolutamente normais, como claros sinais de machismo violento, por exemplo: nós moramos durante um tempo em outro estado, e nesse tempo eu fiquei sem trabalhar. É óbvio que o trabalho da casa ficava todo pra mim, afinal eu estava em casa, não me custava fazer o trabalho. Entretanto, depois que nós voltamos, e eu voltei a trabalhar e estudar, todas as tarefas continuaram sendo minhas, sendo que eu passo muito mais tempo fora de casa. 
Não é só nesse âmbito. Por exemplo: eu não consigo encerrar uma discussão, a palavra final é sempre dele. Eu acabava deixando pra lá, só pra não ficar naqueles loopings de discussões que não acabam nunca, até que, depois desse episódio das estudantes, passei a sustentar minha opinião, e adivinhe só? Ouvi que estava falando demais, e que aquele assunto (seja ele qual for) não me compete, não sou especialista e a minha opinião não vale de nada.
Lola, antes de conhecer seu blog, eu já me considerava uma pessoa a favor da liberdade das pessoas. Eu não gosto de roupa curta, mas quem gostar que use, eu não julgo ninguém por isso. Eu também não bebo, mas quem quiser beber, beba, eu simplesmente não tenho nada a ver com a vida alheia. Mas agora sei que sou feminista, e sempre fui. Eu luto por igualdade, e isso nada mais é do que feminismo.
A minha questão, Lola, é que tenho medo de não ter enxergado esse lado antes e fico me perguntando se sempre foi assim, e eu é que nunca reparei. Tenho pensado muito nisso e até já cogitei me separar, por que machismo comigo não dá, mas amo meu marido e acho que todos merecem aprender e ter segundas chances. Já tentei colocar essas questões e não obtive sucesso. O que te peço é uma luz, uma maneira de lidar com isso sem precisar de extremos, algo que eu possa fazer para tentar mostrar o erro nessas atitudes com as quais estou sendo obrigada a conviver.

Minha resposta: C., querida, obrigada pelo carinho e pela lucidez. Você identificou vários problemas no seu relacionamento que antes passavam batidos, e hoje te aborrecem. E você está tentando resolvê-los.
Ridícula essa imagem? Mas a gente
aceita o inverso sem pestanejar
Concordo totalmente contigo que todos merecem ter a oportunidade de aprender. Seu marido recebeu a educação machista padrão que tantxs de nós recebem (e dão): acreditar que o homem deve ter a última palavra, achar que tarefas domésticas são dever da mulher, crer que, no fundo, alguma coisa uma mulher aprontou pra ser estuprada. Seu marido não é exceção. Infelizmente, esses valores e opiniões ainda são a regra na sociedade machista e patriarcal em que vivemos. 
Claro que, mesmo dentro de uma sociedade machista, a gente pode fazer o melhor possível para se cercar de gente tolerante e inteligente. Casar com um machista realmente complica a vida pessoal de uma mulher. 
Eu e Silvinho em junho
Acho que já disse algumas vezes que Silvinho, vulgo maridão, é a pessoa mais sem preconceitos que já conheci. Sem dúvida essa parte de sua personalidade foi algo que muito me atraiu nele, e que explica porque ele continua tão apaixonante pra mim depois de 25 anos (que vamos comemorar agora em agosto). Mas ele também teve uma educação conservadora e machista.
Quando comecei o blog, 7,5 anos atrás, era bem comum que, nas nossas brigas (quase todo mundo briga, discute, se desentende), ele ficasse muito nervoso e levantasse a voz. Às vezes ele gritava. Óbvio que nunca me xingava (palavrões não fazem parte do seu vocabulário, nem do meu), mas eu não gostava daquela gritaria. Afinal, eu não grito. Sou capaz de discutir calmamente, e nunca apelo pra respostas de menino mimado do tipo "Porque sim!". Comentei algo no blog, e foi uma leitora, não lembro qual, que me alertou que gritar também era um tipo de violência. 
Eu pensei: putz, é mesmo. Faz sentido. E sentei pra conversar com o maridão (claro que não foi no meio de uma discussão!). E coloquei aquilo que minha leitora havia dito, e por que a gritaria me incomodava, e como eu não merecia aquilo, e como eu via isso como uma falha que ele conseguiria corrigir. Ele concordou comigo. A partir daí, ele mudou. E nossas discordâncias passaram a ser muito mais civilizadas. 
Certo, a pessoa tem que estar aberta a críticas e a mudanças. Mas acho que o diálogo sempre vale a pena. Sente-se com seu marido e ponha essas cartas na mesa. O pensamento retrógrado do "essa pediu pra ser estuprada" será confrontado aos poucos, mas você tem que exigir mudanças imediatas, como na participação das tarefas domésticas e no costume ditatorial de querer ter a última palavra. Se ele for uma pessoa sensata, refletirá sobre o assunto. E verá que você não está pedindo nada de mais. 




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