GUEST POST: UMA LEMBRANÇA DE HORROR
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GUEST POST: UMA LEMBRANÇA DE HORROR


Não consigo nem começar a descrever como este relato enviado pela L. me encheu de raiva e pena.

Acabei de ler o relato Mais uma História de horror para sua coleção, e gostaria de por para fora o horror pelo qual também passei. Eu nunca tive coragem de contar pra ninguém, nunca verbalizei o horror de que fui vitima. Eu tentei apagar isso das minhas lembranças, mas é impossivel.
Eram meados da década de 70. Eu tinha 20 anos e estudava numa universidade no interior do Paraná. Morava numa república com mais algumas estudantes, minha família morava numa pequena cidade do interior, e naquela época a gente saía de casa para estudar.
Bem, eu costumava frequentar o Diretório Acadêmico que promovia uns bailinhos no final de semana. O dinheiro era curto, eu não pagava a escola, mas tinha que trabalhar pra pagar o aluguel, e esses bailinhos eram o único lazer de que dispunha.
Eu era bonita, e sempre tinha parceiro para dançar. Apesar de ter 20 anos, ainda era virgem e o máximo de carinhos que tinha recebido de um homem eram uns beijinhos.
Eu cursava Ciências Economicas e os estudantes não se misturavam. Os de Humanas andavam com os de Humanas, os de Exatas com os de Exatas, e assim por diante. Um dia, fui além dos domínios do corredor de humanas e conheci um rapaz, o Paulo, que estudava Engenharia. Conversamos e ele me convidou pra ir no baile no próximo sábado. Eu disse sim, que nos encontrrariamos lá. Só que nesse interim, um garoto pelo qual eu era apaixonada (vamos dizer que ela chama Jorge) veio falar comigo. Eu fiquei muito feliz, eu andava arrastando as asas pra ele desde o começo do ano, e agora ele percebia que eu existia. Pois bem, quando chegou o sábado, lá no Diretório eu falei para o Paulo que eu não podia ficar com ele, que eu iria ficar com o fulano, contei que era apaixonada, essas coisas. Ele foi super compreensivo, e o resto da noite foi tranquila. Dancei a noite toda com o Jorge e fui pedida em namoro por ele. Não cabia em mim de tanta felicidade...
Na segunda feira eu estava chegando na escola e encontrei o Paulo. Muito simpático, ele me cumprimentou, perguntou como estava, se estava feliz, dava mostras que compartilhava a minha felicidade. Contou que estava triste, que precisava de alguém pra conversar. Eu, que estava feliz, achei que não custava nada dar um pouco de atenção pra uma pessoa que estava precisando de conforto. E ele foi de tal forma me convencendo, que aceitei entrar no carro dele, uma caminhonete último modelo naquela época. 
Foi só eu entrar no carro que a fisionomia dele mudou. Ele trancou a porta, arrancou com o veiculo e rumou pra um lugar deserto, no meio do mato. Começou a me bater, mordeu meu ombro, mordeu de quase tirar um pedaço, mandou eu tirar a roupa, me chamava de vadia, dizia que eu o havia humilhado, que eu era uma pobre e ele um cara rico, que nunca ninguém o tinha recusado. Eu implorava, dizia que era virgem. Parecia que minhas súplicas o deixavam mais excitado e nervoso. Eu me recusava e colaborar e ele me batia. Nem lembro quanto tempo durou, mas só de lembrar hoje, passados três décadas e meia, ainda sinto o cheiro dele, a dor no meu ombro, a minha vergonha.
Quando ele conseguiu o que queria, disse que não iria me matar, mas que eu aprendesse a lição. Me levou até o portão da minha casa, e eu entrei com a minha vergonha e minha dor.
Nunca falei disso pra ninguém, nem com minhas amigas, nem com meu marido (fui casada durante trinta anos), nem como a terapeuta quando fiz análise por conta de uma doença que tive.
E depois disso, eu ainda o via na faculdade. Tive vergonha de denunciá-lo. Se hoje em dia ainda culpam as mulheres, imagine naquela época?
Depois da faculdade mudei de cidade e nunca mais soube dele. Ainda lembro seu nome, mas nunca tive coragem de por o nome dele no Google pra saber por onde anda.
O que isso fez com a minha vida? Isso não me impediu de seguir em frente, mas o sexo pra mim esteve sempre associado a dor, vergonha, medo.
Contar isso talvez possa pesar menos... ou não. Só sei que vivo com essa lembrança de horror.
Escrevi isso de um jato só, não tenho coragem de reler ou de  corrigir, pois se lê-lo talvez nem tenha coragem de enviar. [Eu fiz algumas correções mínimas].




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